O
futebol, no Brasil, não é apenas uma modalidade esportiva. É uma das expressões
culturais mais relevantes, junto com o carnaval, o samba, a umbanda, entre
outras. A identidade de uma nação de quase duzentos e vinte milhões de
habitantes se expressa no gramado praticamente todos os dias, e é vista por
milhares de brasileiros através dos mais diferentes meios de comunicação e
informação.
Quando
um político quer ser entendido pelas massas, quando ele deseja que a sua
mensagem faça sentido para o eleitor, ele recorre a metáforas envolvendo
situações que se apresentam nas partidas de futebol. Ferreira (2019), enfatiza
que "o futebol é em si mesmo, no campo, uma metáfora da guerra, e os
próprios jogadores são caracterizados metaforicamente (defesas e atacantes),
bem como há chutes que são bombas e mísseis".
Através
das metáforas, podemos transcender os aspectos imediatos - técnicos e táticos
(por exemplo) - para expressarmos o futebol além das quatro linhas.
Nesta
direção, podemos dizer que ontem, a batalha entre os "timoneiros" e
os "remadores", projetada na telinha dos televisores, smartphones e
afins, transcendia o drama técnico/tático. O Corinthians não enfrentou o
Remo. Ele enfrentou a sua história. O seu maior desafio não era reverter a
vantagem do seu oponente, mas expressar fielmente os valores
conquistados pelo movimento da "Democracia Corinthiana".
Não
podemos nos esquecer que isso ocorre em um momento histórico específico: nós
estamos tentando nos reconstruir após uma guerra interna, fruto de uma política
neofascista, que ceifou a vida de mais de 700 mil brasileiros. O processo de
reconstrução nacional passa por processos de várias curas. Isso é fundamental
para um país que foi, desde a sua origem, violentado. Que se desenvolveu
através da tentativa de eliminação dos seus povos originários e que até recentemente, vide a situação dos Yanomamis, continuava este processo.
A
violência, de qualquer ordem e exercida em qualquer tempo, precisa ser
combatida. Ela não é só estrutural. É estruturante do modo de vida
de uma nação. O Brasil, não nos esqueçamos, é o país que mais mata homossexuais. Em pleno século XXI, a população negra continua liderando estatísticas trágicas. Não podemos permitir sua naturalização. Combater a violência faz parte deste processo de cura. A impunidade dos nossos algozes não pode mais ser tolerada.
Ao
entrar em campo, ontem, Cuca, então técnico do Corinthians, condenado na
Suíça por participar de um estupro de uma criança de 13 anos, em 1987,
trouxe a imagem da impunidade consigo. A imagem deste Brasil que flerta com o passado, que teima em não se modernizar. Mas nós expressamos, recentemente, que a
Anistia não é uma solução para nossos problemas. E assim como “o futebol foi
capaz de servir de palco para muitas preocupações e esperanças do povo brasileiro”
(DaMatta) hoje, ele mais uma vez nos ajuda a reafirmar que #AnistiaNão!!!