quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Carol Solberg

A jogadora de Voleibol de praia, Carol Solberg, foi advertida pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva devido ao seu posicionamento político contra o governo Bolsonaro. No dia 20 de setembro, frente às câmaras de uma rede de TV, logo após uma entrevista em que falava sobre o terceiro lugar conquistado no Circuito Brasileiro de Volei de Praia a atleta, microfone em punho, gritou em alto e bom som um "FORA, BOLSONARO!!!"

Para o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), naquele momento, Carol Solberg infringiu dois Artigos: o 191 que implica, entre outras coisas, questões relativas ao regulamento geral da competição, e o Artigo 258 que menciona questões que contrariam a disciplina ou a ética esportiva que não esteja tipificada no Código Brasileiro de Justiça Desportiva.

Por conta de sua atitude, a atleta poderia ser multada em 100 mil reais e pegar suspensão de seis jogos em competições oficiais. Nada disso aconteceu, tendo o STJD convertido a multa e a suspensão em advertência, proibindo Solberg de repetir qualquer ato político na condição de atleta.

Em depoimento, antes do julgamento, assim se pronunciou a jogadora que enfatizou não está nem um pouco arrependida por ter criticado o governo de Jair Bolsonaro.

“Estava muito feliz de ter ganhado o bronze e, na hora de dar minha entrevista, apesar de toda alegria ali, não consegui não pensar em tudo o que está acontecendo no Brasil, todas as queimadas, a Amazônia, o Pantanal, as mortes pelo Covid e tudo mais. Me veio um grito totalmente espontâneo de tristeza e de indignação por tudo que está acontecendo (...)".

Vale recordar que na época da campanha, teve foto no pódio com clara manifestação política dos atletas da seleção masculina de voleibol, e acertadamente, a Confederação Brasileira de Voleibol não se posicionou. O que coloca a necessária pergunta: Por que a CBV se posicionou tão veementemente contra a atitude de Carol Solberg? O problema é se posicionar politicamente ou é o tipo de posicionamento que incomoda?

Mundo afora os atletas de diferentes modalidades vêm se posicionando politicamente e a favor de causas universais, contra o racismo, violência nos estádios, homofobia entre outras pautas relevantes. Existem inúmeros exemplos de utilização política do fenômeno esportivo no mundo inteiro, principalmente por quem detém o poder. Por que o atleta não pode ter o mesmo direito? Por que ele não pode se posicionar, seja a favor ou contra determinadas direções da política desenvolvida no seu país ou da falta dela?

Ao advertir a atleta Carol Solberg pelo seu posicionamento como brasileira, acima de tudo, o STJD está mandando um recado claro para todos os atletas de todas as modalidades do esporte nacional: calem-se!!! Se é para criticar o governo, melhor ficar calado e se deixar alienar da sua condição de humano e do seu direito constitucional de se expressar livremente.

Para finalizar, algumas perguntas: o que farão os atletas em geral? Como se posicionarão as instituições, principalmente às ligadas ao esporte? A sociedade de uma forma geral, como reagirá? Aguardemos.

sábado, 25 de abril de 2020

Educação rima com revolução

25 de abril. Um dia muito especial para todos que acreditam em outras formas de sociabilidade, novos "modelos" de relações sociais. Algo que tem se falado muito nesses últimos dias.

Hoje, comemora-se a Revolução dos Cravos, movimento que derrotou e derrubou o regime salazarista em Portugal, no a
no de 1974, estabelecido após o golpe militar em 1926.

A relação desse momento histórico com os livros que compõem a imagem é para defender a necessidade de uma educação crítica, em todos os tempos históricos e, principalmente, nesse de "irracionalismo", "terraplanismo", "globalismo", "negacionismo", em que estamos vivendo.

Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. Nos ensinou Paulo Freire. Ouso acrescentar que não é qualquer educação que potencializa essa capacidade efetiva de transformação social e nós, professores, precisamos enfrentar esse debate de maneira franca e fraterna.

Os portugueses comemoraram a vitória da revolução que os devolveu a liberdade de expressão, distribuindo cravos, a flor nacional. Façamos, portanto, da flor nosso mais forte refrão, e acreditemos que a revolução também se faz com educação.

(A imagem dessa postagem origina-se da capa dos seguintes livros: "Pedagogia histórico-crítica e educação física", da editora da Universidade Federal de Juiz de Fora; "A civilização capitalista", editora Saraiva e "Dominação e Resistência: desafios para uma política emancipatória", da editora Boitempo)

quarta-feira, 15 de abril de 2020

O que fazer em casos de violência doméstica durante o isolamento



As primeiras semanas de isolamento nos trouxeram dados assustadores sobre violência contra as mulheres no nosso país. Não bastasse o acúmulo ou aumento de pressão e trabalho por conta da quarentena, de toda responsabilidade compulsória que a mulher possui em nossas sociedade a respeito de tarefas domésticas e cuidado dos filhos, aumentar o período em que os agressores ficam em casa tornou os lares um ambiente hostil.
Problema que não foi observado apenas no Brasil. China e Itália também registraram números crescentes de violência contra mulheres durante o isolamento necessário para redução de contágio do Covid-19. O que nos faz pensar que além de ser um problema a ser superado em questões culturais em vários países, também é um problema estrutural e de saúde e segurança pública. Afinal, impactam na saúde física e psicológica das mulheres, filhos e parentes que se aproximam desses episódios, cabendo ao Estado desenvolver políticas efetivas para o combate.
Entretanto, pensando no descaso e banalização que o atual governo demonstra a respeito da violência contra as mulheres (o próprio chefe do Executivo já foi condenado por incitação ao estupro e naturalizou a violência crescente dizendo que os homens estão batendo nas mulheres porque está faltando pão) devemos desenvolver estratégias de combate ou de antecipação a estas violências pensando no bem-estar e integridade física dessas mulheres. Princípios base ou fundamentos da nossa defesa pessoal no Jiu-jitsu.
Devemos ter sempre em mente que estas mulheres sofrem de maneira progressiva as violências. Como falei no início do texto, a própria conjuntura já é violenta e desgastante. Por isso, devemos cogitar que as mulheres que vivem numa relação abusiva sentem-se sozinhas, e enfrentar o medo e a solidão é o primeiro combate a ser encarado.
Ao identificar uma amiga ou companheira de treino ou não, que esteja passando por isso neste período de quarentena, devemos apoiá-la, acolhe-la e orientá-la ao atendimento jurídico e psicológico, como sinalizou a colega Tatiana Peev no seu texto, apresentando o grupo de apoio Justiceiras. Outras plataformas de apoio também estão disponíveis na internet, como os Apps PenhasSOS MulherSalve MariaMe Respeita ou as plataformas Mapa do Acolhimento e Conexões que salvam. Claro que é importantíssimo que a denúncia seja feita nas delegacias especializadas ou do próprio bairro.
Teremos que pensar também que este período de confinamento potencializa uma série de impedimentos psicológicos à vítima no que diz respeito a dependência financeira ou medo de se manter ou sustentar seus filhos, se for necessário que ela saia de casa. Sua autoestima foi afetada e ela pode acreditar que não é nada sem o agressor. Ela teme por perder sua estrutura familiar construída, de ter sua competência para criar os filhos questionada e de perder as pessoas ao seu redor. Muito cuidado ao criticar ou a menosprezar a situação da vítima. Isso não ajudará em nada.
Para auxiliar na antecipação das vítimas nos casos de violência, é importante observar alguns comportamentos que os agressores apresentam:
Fase 1
Faz piadas agressivas;
Chantageia
Mente
Ignora a mulher
Tem ciúmes
Faz a mulher sentir-se culpada
Humilha
Intimida
Ameaça
Fase 2  
Proíbe a mulher de qualquer atividade
Destrói bens pessoais
Brinca de bater, beliscar ou dar tapas
Fase 3
Dá chutes na mulher
Confina
Ameaça com objetos ou armas
Ameaça de morte
Força relação sexual
Estupra, mutila
Diante da observação dessas atitudes, é necessário criar estratégias para se proteger dentro de casa no período e confinamento.
  • Evitar discutir em ambientes da casa que forneçam algum tipo de objeto que possa ser usado como arma pelo agressor. Um dos ambientes mais perigosos da casa é a cozinha, pois lá estão facas, garfos ou outros objetos pontiagudos;
  • Facilitar o acesso a portas e deixá-las destrancadas, para qualquer emergência ou fuga;
  • Combinar com vizinhas ou parentes próximos sinais sonoros convencionados para alertar que está sofrendo violência (Pode ser bater em panelas, apitar) ou mesmo gritar socorro;
  • Mantenha sempre um número de emergência pronto no aparelho celular, como também crie estratégias de permanecer com o aparelho sempre com você;
  • Deixe roupas e alguns documentos na casa de amigos, para no caso de alguma emergência não seja necessário perder tempo procurando ou arrumando uma mochila;
  • Se possível, fazer uma cópia da chave do carro, pois pode ocorrer do agressor tomar ou escondê-la ao perceber sua intenção de fuga.
Observar os sinais é imprescindível neste momento e sempre se antecipar, são as melhores ações no quesito análise de risco durante a quarentena. Mantenha sempre contato com suas amigas e amigos, desabafe, pois nenhuma mulher é obrigada a passar por nada sozinha, ainda mais em tempos de isolamento social.
Conversando podemos nos fortalecer psicologicamente como também podemos desenvolver melhores formas de se enfrentar os problemas. Informe-se sobre os telefones das delegacias especializadas, do bairro ou disque 180. Denuncie.

Publicado na Bjj Girls Mag em 13/04/2020. Autor: David Torres

sábado, 11 de abril de 2020

Ciência não é jogo de futebol

Foto do meu arquivo pessoal


Jorge Gioscia Filho, telespectador da TV 247, em texto monetizado disse que "Ciência não é jogo de futebol. Não é com torcida que se trabalha mas com pesquisa". Colocou esse raciocínio no momento em que os jornalistas Leonardo Attuch e Brian Mier discutiam sobre a insistência do presidente do Brasil em relação ao uso da hidroxicloroquina para os contaminados pelo Covid-19.

Não é difícil concluir, com referência ao texto presente na mensagem, que Jorge resume o jogo de futebol ao que ele enxerga na televisão, especificamente os 90 minutos que se desenrolam os lances na telinha. Ou então, como muitas vezes fazemos, utiliza da modalidade esportiva mais popular do país para passar um recado rápido e importante: não se cuida de coisa grave - como uma pandemia - com paixão ou emoção. Elas até podem e talvez devam existir no processo, desde que balizadas pelo imprescindível conhecimento científico.

Independente da intencionalidade de Jorge, sua observação pertinente serve como possibilidade de refletir para além das aparências em relação a dimensão esportiva. Ao contrário do que muitos talvez imaginem, há muita ciência no desenvolvimento das modalidades esportivas. Há muita reflexão sobre o esporte vinda das mais diferentes áreas do conhecimento.

Do sofá da nossa casa, da mesa do bar com os nossos amigos e/ou amigas, das arquibancada dos estádios  ou das modernas arenas, das quadras poliesportivas, entre outros, todos nós estamos assistindo, seja como torcedor ou apenas alguém que gosta de assistir competições esportivas, aos resultados não da competição em si, mas de várias técnicas e métodos de estudos visando melhorias das performances dos atletas.

Antes mesmo da bola rolar, do velocista ou maratonista começar a correr, do nadador iniciar suas braçadas nas raias, enfim, do atleta enfrentar os limites e as possibilidades dos seus gestos, assumindo por completo a máxima da prática como critério da verdade, a ciência se fez e se faz presente.

Quando se trata da dimensão social do esporte competição, ouso afirmar que o mesmo, na atualidade, não existe sem alguma dose de ciência. Desde suas indumentárias, assim como seus objetos de treinamento e competição, passando pela influência  ideopolítica e sua possibilidade de integração, emancipação e inclusão social, tudo é pensado cientificamente.

Concordo com Jorge sobre o risco que representa enfrentarmos uma pandemia que está matando milhares de pessoas no mundo inteiro, com as paixões e emoções próprias aos torcedores, sejam os de poltrona ou não. Apenas reforço que o esporte, seja o futebol ou qualquer outro, na sua dimensão de espetáculo, de rendimento, está completamente impregnado de ciência.

domingo, 5 de abril de 2020

O esporte em tempo de coronavírus - Primeira parte

Mais um domingo sem assistir em tempo real minhas modalidades esportivas preferidas, principalmente as partidas de futebol. Mais um domingo sem tentar uma "fezinha" na peleja entre Barcelona e Real Madrid, Vitória e Bahia, Flamengo e Fluminense, Schalke e Dortmund, entre outros.

Mais um final de semana em que as arenas estão fechadas para as contendas esportivas. Não haverá cestas mirabolantes, esteticamente maravilhosas e inéditas dos formidáveis Stephe Curry, LeBron James ou Kawhi Leonard. O pivô Ferrão, os tricampeões mundiais Rodrigo, Leandro Lino e Danilo Baron, não preencherão o coração dos fãs do Futsal.

Há muito a fórmula 1 nos deixou um vazio com a morte do ídolo Airton Senna. Vazia também estarão as quadras de tênis, voleibol, handebol, os campos de beisebol, golfe, pistas de kart. A bola oval não provocará o touchdown, assim como não veremos o fumble e o punt, entre outros, em mais um domingo.

Imagem retirada do Jornal O Correio
Em mais um final de semana sem as várias expressões da cultura corporal (que não se resume a dimensão esportiva), excetuando as diferentes estratégias das emissoras e canais esportivos, em função do coronavírus, de reprisar disputas diversas, a pergunta que emerge é: o que fazer? O que será da vida sem o esporte? O que faremos sem essa dimensão social que ocupa, tão fielmente, nosso cotidiano, que se faz tão presente nas nossas vidas ao ponto de em algum momento imaginarmos ser impossível viver sem?

Exagero de minha parte? Não? Sim? Talvez? Insensibilidade? Indiferença? O que é todo esse vazio esportivo frente ao sofrimento de centenas e milhares de pessoas que estão perdendo seus entes queridos por conta de mais uma pandemia que assola o mundo?

Ou será algo que está presente na dimensão do nosso inconsciente, sejamos ou não um torcedor de poltrona, praticante ou não de alguma modalidade esportiva e que só agora, no vazio da sua espetacularização, na ausência da sua midiatização, no hiato do seu televisionamento, os questionamentos citados emergem, permitindo reflexões diversas, como essa que agora faço e que continuarei na próxima postagem.

quinta-feira, 2 de abril de 2020

BBB e futebol

Entre os dias 29 a 31 de março de 2020 observou-se algumas manifestações por parte de atores do futebol em apoio a um integrante de um Reality Show de uma rede aberta de TV. Nesse período ocorreu o décimo paredão da edição e foi integrado por três participante, sendo dois os protagonistas do processo. 

De um lado, uma atriz e cantora nacional extremamente politizada e consciente de causas sociais, e, do outro, um arquiteto e empresário que por diversas vezes na casa apresentou comportamento machista, autoritário, explosivo, imaturo, e até chegou a naturalizar causas como a zoofilia. 

Ocorre que, o referido arquiteto, mostrou durante o tempo na casa que se tratava de um amante do futebol. Apesar de nunca se tornar um jogador profissional, contou suas experiências em quadra e campo, além de se declarar corintiano enraizado. Esse fator, somado ao resgate de uma publicação que a sua adversária fez, anos atrás, contando que não gostava do esporte, levou ao apadrinhamento do arquiteto pelos jogadores de futebol. 

Publicações em texto, imagem e vídeo, declararam o apoio de figuras midiáticas do futebol ao arquiteto, o que fez com que uma grande camada da população se mobilizasse, por venerar essas figuras, a apoiar esse indivíduo independente da análise de outras vertentes do seu comportamento na casa. 

Imagem retirada do site O Dia

Esse fato nos mostra a magnitude da influência do futebol na sociedade em geral e nas subjtevidades. A espetacularização desta modalidade esportiva eleva sua popularidade ao ponto de torná-lo ‘sagrado’, e faz com que a população o apoie apenas por ser futebol, livre da análise de conceitos e valores.

Isso também é ilustrado quando recordamos dos vários escândalos, por diferentes motivos, envolvendo jogadores famosos, que não apagam nem mesmo mancham a sua reputação diante de admiradores do esporte. 

Os seus atores se tornam referências para crianças e adultos, e apesar do atual contexto histórico em que há um vazio esportivo devido à suspensão das competições em função da pandemia por coronavírus, essa referência se apresenta com muita força sobre qualquer situação em que se manifestar.

O paredão também se tornou uma disputa política quando virou pauta de uma publicação do filho do presidente da república, que defendeu o arquiteto argumentando que a cantora era uma militante esquerdista. Mais uma vez mostrando o seu desprezo por todas as causas sociais que a cantora defende e que são necessárias.

Texto escrito pela professora Vitória Lima Oliveira Morais

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Micheli Ortega Escobar. PRESENTE!!!

Micheli Ortega Escobar - Fonte: Revista Motrivivência

"Doutorando que se preze deve ler, no mínimo, 500 páginas por dia de referência do seu objeto de estudo". Essa frase foi dita, certa feita, pela professora Micheli Ortega Escobar em um dos vários momentos que tínhamos o prazer da sua presença nos nossos grupos de estudos.

Óbvio que era uma provocação seguida de uma exortação para as necessárias leituras em um momento que havia um "recuo teórico" na academia por parte de certas orientações pós-modernas de recrudescimento do relativismo epistemológico.

Conhecendo como conhecia a condição material de existência da classe trabalhadora, Micheli reconhecia que a apropriação do conhecimento, fundado no materialismo histórico dialético, era força revolucionária ao penetrar nas massas e que para tanto, tínhamos a obrigação, igualmente revolucionária, de nos apropriarmos da assertiva leninista: "sem teoria revolucionária, não há prática revolucionária".

Essa brasileira de alma chilena que nos deixou hoje, fisicamente, deixou também um enorme legado que a fará presente no cotidiano de todes que têm compromisso com a mudança estrutural do metabolismo do capital e que reconhece, na educação/educação física, um espaço estratégico para potencializar/materializar novas formas de produção e reprodução da existência. E essas formas estão presentes nas experiências históricas do socialismo/comunismo que Micheli, tão bem, soube expressar na sua práxis.

Em alto e bom som, meus sinceros e profundos agradecimentos professora, lutadora do povo, Micheli Ortega Escobar. Presente!!!