O presente texto
objetiva refletir um pouco mais sobre a Copa do Mundo que ocorrerá sim, no
Brasil, daqui a pouco mais de um mês. Ele assume como inspiração a leitura do
texto do senhor Jorge Luiz Souto Maior, que foi compartilhado no blog do
sociólogo de formação e jornalista esportivo, Juca Kfouri, tendo sido
disseminado nas redes sociais.
A tese defendida pelo autor do texto é simples: a Copa já era. Para tanto, ele usa a hipótese de que o evento “(...) já não terá nenhum valor para a sociedade brasileira e, em especial para a classe trabalhadora, restando-nos ser diligentes para que os danos gerados não se arrastem para o período posterior à Copa”.
A tese defendida pelo autor do texto é simples: a Copa já era. Para tanto, ele usa a hipótese de que o evento “(...) já não terá nenhum valor para a sociedade brasileira e, em especial para a classe trabalhadora, restando-nos ser diligentes para que os danos gerados não se arrastem para o período posterior à Copa”.
No meu
entendimento, este argumento inicial não se sustenta em função do seu
unilateralismo. Dizer que a Copa “já não terá nenhum valor para a sociedade
brasileira” é homogeneizar esta sociedade, tão desigual e com interesses não só
distintos como, sobretudo, antagônicos. É aqui que reside especificamente a
minha reflexão, na forma como a sociedade se organiza no interior de um
determinado Bloco Histórico.
Penso
que o sucesso desse texto deve-se justamente a este argumento unilateral. Todo
o seu conjunto não reforça nenhum aspecto positivo sobre a Copa do Mundo. Não
existe? E assume o conceito de legado como algo feito para o evento em si,
desconhecendo que as ações que estão sendo realizadas fazem parte do Plano de
Aceleração do Crescimento (PAC 1 e 2) e independe do megaevento. Assumindo estas
características, ele agrada tanto aos gregos – oposição de direita – quanto aos
troianos – oposição de esquerda, fragilizando esta em especial por descolar dos
seus argumentos o que historicamente lhe deu força organizativa e de
enfrentamento: os aspectos das lutas de classes.
Um
dado, imagino, pode esclarecer o que estou querendo dizer de uma maneira mais
objetiva e que traduz a hegemonia do capital no seio do bloco histórico. Ao
centralizar o argumento sobre a base de que a “Copa já era” e que a mesma será
deletéria para a classe trabalhadora indistintamente, ele tira do foco o que é
fundamental na pauperização dos subalternos: a apropriação privada dos meios de
produção da vida. O problema, no meu entendimento, não está nas palavras de
ordem “Não Vai Ter Copa”, “Vai Ter Copa” e agora esta de que “a Copa já era”,
mas, sim, na forma metabólica de organização do capital.
Para
termos uma ideia de como esse assunto é controverso, se compararmos apenas o
que o Estado de São Paulo arrecadou em 2013 só nos pedágios, daria para construir
mais 12 estádios para a Copa. O que estou querendo dizer com isso? O Estado é
rico. Mas esta riqueza é canalizada para determinados extratos da sociedade e é
tão deletéria para a “classe trabalhadora” que mesmo com todas as “diligências”
históricas possíveis, “os danos gerados” não só se apresentaram como se arrastam
desde os oitocentos e neste período não tínhamos Copa.
Os
gastos que o Estado brasileiro vem tendo com a construção das chamadas Arenas
equivalem a duas semanas de pagamento, pelo Tesouro Nacional, de juros aos
bancos. Não por acaso o Bradesco, recentemente, anunciou o crescimento de 18%
de lucro líquido (R$ 3,443 bilhões) só no primeiro trimestre deste ano. E podem
esperar os anúncios exitosos dos outros, privados e públicos.
Com
isso, não estou querendo defender o indefensável nem, tampouco, arrefecer as
críticas aos megaeventos que considero mais do que necessárias. Quem me conhece
sabe dos meus posicionamentos desde o Pan-Americano de 2007 no Rio de Janeiro,
todos sendo atualmente mais do que comprovados que tínhamos razão ao fazer a
crítica e quem acompanha este blog desde a sua criação, em 2009, sabe do
conteúdo destas críticas. Até sobre os Jogos Olímpicos de 2016 estamos falando
desde 2010.
Não é meu intuito aqui
amenizar as necessárias críticas sobre os desmandos do dinheiro público, sobre
os acidentes de trabalho que vitimaram vários operários em estados distintos, sobre
o lucro exorbitante que a FIFA terá, sobre as remoções de famílias inteiras, sobre
a flexibilização da Lei de Responsabilidade Fiscal entre outros pontos que são
ricamente apresentados no texto apreciado. Mas apenas problematizar que isso se
dá no contexto do estado que temos e não em um estado ideal de expressão do meu
desejo, de como eu gostaria que o mesmo fosse.
Criticar
não é falar mal. Não é apenas apresentar onze argumentos que dizem sim, muitas
verdades, mas que escondem o essencial, tornando o texto, guardada suas devidas
proporções, uma peça sofismática. Tenho acordo com a grande maioria das
críticas do senhor Souto Maior, e penso que algumas necessitariam de maiores
mediações, mas os seus argumentos se apequenam ao se prenderem a uma lógica
conceitual pré-concebida e sabida de todos nós, que o evento Copa do Mundo não
está trazendo os benefícios que foram apresentados quando concorreu com outros
países, notadamente para a classe dos subalternos, já que o capital financeiro está rindo que é uma beleza.
O que
tem de novidade no texto é a quantidade de elementos apresentados e o grau de desenvolvimento
dos mesmos em função do momento em que ele é escrito, permitindo sua
atualização. Se fosse escrito em 2007, ele faria uma crítica aos absurdos 2
bilhões de reais que estavam previstos nas projeções da matriz de
responsabilidade. A projeção atual saltou para 8 bilhões. O fenômeno da crítica,
no entanto, é o mesmo.
Isso
não diminui a força do texto, mas, insisto, isso não pode se resumir à Copa do
Mundo em si. No meu entendimento tudo o que vem ocorrendo, que deve ser
combatido, criticado, denunciado, SIM!!!, diz respeito a um aspecto que vem
sendo esquecido no contexto da luta mais geral e que considero central: a
exploração do capital. Essas críticas que se apresentam no texto devem sair do
seu aspecto particular e se assumir como fundamento da luta mais geral de
enfrentamento do capital. Quando leio textos com este conteúdo, procuro dá esta
direção. Penso que o esquecimento do “inimigo comum” está colocando todas as
oposições, de direita e de esquerda, de mãos dadas na crítica sobre o mesmo
fenômeno, a Copa do Mundo, deixando de lado o capital.
Existe aqui uma questão
que é programática. A esquerda não pode se esquecer de que esse debate sobre
vai ter ou não a copa do mundo e que agora a copa já era vem se esquecendo do
fundamental da luta de classe: a apropriação do valor produzido e reproduzido
pelo megaevento. Para nós isso é fundamental! É o que nos distingue
historicamente da direita, reacionária e raivosa que vem ultimamente “saindo do
armário”.
Falta ao governo da
Dilma Rousself, reconheço, uma radicalização das perspectivas democráticas e
populares. Difícil na atual correlação de forças no interior do Congresso
Nacional. Mas a aprovação do Marco Civil da Internet demonstrou que mesmo nesta
coalizão desfavorável, característico da forma política que herdamos da
ditadura militar, podemos fazer mais do está se fazendo.
Que Juca Kfouri
reproduza textos como esse, que atende as perspectivas dos críticos críticos no
seu blog sob uma plataforma do Universo On Line (UOL), braço da Folha de São
Paulo, vá lá. Que o senhor Jorge Luiz Souto Maior desenvolva esse belíssimo e riquíssimo
raciocínio, que deve nos ajudar na proposição de um novo bloco histórico, ótimo.
Eu aplaudo de pé. O que me causa estranheza é vê-lo sendo reproduzido por
setores que mesmo reconhecendo que o outro projeto societário é necessário, mas
que é impossível com os partidos conservadores tradicionais que temos, faça
deste limão uma limonada e se somem aos discursos unilaterais e conservadores
que querem desestabilizar o governo federal com o tal “Não Vai Ter Copa”, “Da
Copa Eu Abro Mão” ou “a Copa Já Era”, frases destituídas de posição de classe
definida e que não tem nenhuma proposta de radicalização democrática.
Por fim, o texto do
senhor Souto Maior me serve para ampliar o espectro da crítica na direção do
desenvolvimento de uma consciência superadora da forma de exploração do Capital.
Fazer a crítica a Copa do Mundo no atual estágio de desenvolvimento do
megaevento, com as palavras de ordem já citadas, no meu entendimento, é golpe.
Não vou compactuar com isso.
Da Copa eu sempre abri
mão. Já disse. Mas agora que teremos, devemos utilizar os erros e acertos (sim,
tiveram acertos) junto com as críticas do texto do Souto Maior para dizer a
população que o problema essencialmente está não neste ou naquele evento
específico. Mas na forma como o bloco histórico se organiza.