Texto publicado em Outubro de 2019 pela Bjj Girls Mag
Eu estava numa aula de
uma turma adolescente quando vi uma movimentação em que um atleta machucou o
outro seriamente, que logo caiu em lágrimas no chão ao som de uma canção
popular aqui na Bahia: “porque homem não chora!”. Perguntei ao aluno qual o
motivo dele estar fazendo chacota do amigo se a movimentação teria realmente
machucado. Ele disse que achava que ele tinha que engolir a dor e seguir no
treino. Aquilo não foi nada, “não é homem não?”
Já na nossa gestação,
após aquela ultrassonografia para que saibamos se a criança é “menino ou
menina” passamos por determinações sociais que nos impõem uma série de condutas
a serem seguidas por toda a vida. É só observar os recentes “chás de revelação”.
As cores rosa nos indicam que a criança que nascerá será uma menina, e o azul,
como diria a Ministra da “mulher” Damares Alves, que será um menino. Uma
espécie de estereotipia que não terá total influencia na relação entre gênero e
sexualidade.
A partir deste momento
são estabelecidas “caixinhas” comportamentais. As meninas são privadas de uma
série de brincadeiras numa fase importantíssima de desenvolvimento de
habilidades motoras – não apenas - (Correr, saltar, trepar, pular, rolar...) porque
não é coisa de “mocinha”. São educadas para serem solicitas, vulneráveis, e
seus brinquedos sempre agregam conotações de vida doméstica ou do cuidado do
outro: Bonecas, conjunto de cozinha. Já
os meninos, são sempre incentivados a participarem de brincadeiras que estimulam
a agressividade, e possuem brinquedos que reproduzem a mesma lógica (Armas,
bonecos com armaduras, espadas).
Para termos uma ideia
do quanto essa relação é pesada, voltemos ao caso do início do texto: Alguém
questionou a atitude agressiva do aluno que machucou o outro e ainda fez
chacota da situação cantarolando uma canção? O que ele fez, por incrível que
pareça, é o exemplo de comportamento que nossa sociedade busca para todos os
homens: Um homem forte, valente, que
supera as dores e as adversidades, um homem “embrutecido” que reprime
totalmente seus sentimentos.
O grande problema é
que, mais cedo ou mais tarde, este mesmo rapaz usará os mesmos argumentos para
agredir ou violar mulheres, como vemos cotidianamente: Por que ela apanhou,
deve ter feito algo. O que fez pra merecer ser violada? Pois nessa lógica ele
está cumprindo o papel que sempre lhe foi atribuído e a culpa sempre será da
vítima, pois ele foi educado a pensar assim. O assédio sexual o estupro ou a
violência física nada tem a ver com prazer, e sim, com uma relação de poder que
visa colocar a mulher numa condição de inferioridade.
E é por essas e outras
questões que temos que entender o que é a masculinidade hegemônica e quais as consequências que ela traz para nossa vida
em sociedade. É
uma construção negativa de masculinidade que nos coloca (homens) numa posição
irracional, como se não fossemos capazes de dominar nossas pulsões, oprimindo nossa
vida para manter a “ordem natural da sociedade”, nos fazendo acreditar que
somos sempre fortes, superiores, nos fazendo buscar sempre aparentar ser extremamente
ativo sexualmente, nos fazendo ter medo de parecermos “femininos”, nos
colocando a todo momento numa lógica competitiva, buscar defender nossa honra,
e termos uma exacerbada obsessividade por poder. Mais um subproduto dos modos de reprodução da vida no capitalismo. Assim como o racismo.
Podemos observar, além
do nosso exemplo do início do texto, alguns colegas de treino que não aceitam
serem finalizados de forma alguma, os colocando numa situação de risco de
lesões ou até mesmo de complicações mais graves, com aquela lógica “apaga mas
não bate”. Atletas que subestimam as mulheres dizendo que vai lutar com a
colega para “descansar” e que ao perceber que está em desvantagem, esquecem
totalmente da técnica para partir para a clara agressão física. Machucando,
lesionando, ou até afastando do treino. Que não lutam com mulheres porque “não
dá treino para o seu nível” Não esquecendo os comentários: Tá rolando como uma
“menininha”, buscando colocar o outro numa posição de inferioridade
referenciando-se numa ideia de feminino vulnerável, inferior.
A homofobia anda de
mãos dadas com essa lógica. Perguntem a qualquer homem o motivo dele chamar o
colega de treino de forma pejorativa: “bicha”, “viado”. Como se ser homossexual
fosse uma coisa ruim. Não esquecendo que essa construção anula qualquer forma
de demonstração de afeto entre homens por receio de serem “mal vistos” ou mesmo
serem confundidos como casal homoafetivo. Reprimindo violentamente o homem e as
pessoas próximas. Imagine como é hostil para os colegas de treino homossexuais
serem classificados de coisa ruim? O que não tem nada de diferente da
perseguição que já sofrem fora dos tatames. O assédio sexual a colegas de
treino também pode ser incluído neste pacote
Essa construção tem
outros resultados negativos. No
nosso país e no mundo a expectativa de vida dos homens está sete
anos a baixo das mulheres. Os fatores relacionam causas biológicas mas as
construções culturais interferem totalmente. Não fazer visitas periódicas ao
médico e o comportamento agressivo e arriscado estão nesta lista. Por causa
desse comportamento também os homens
morrem mais em acidentes de trânsito do que as
mulheres no Brasil. Por medo de “ferir” essa masculinidade, os homens
cometem suicídio pois acreditam que é “frescura”
comentar o que estão sentindo, ou porque simplesmente não encontram apoio
dentro dos seus círculos de amizade. O abuso de álcool e outras substâncias
também entram nesse quadro.
Por se tratar de um
tipo de relação que causa danos não só para os homens mas também para as
mulheres e LGBTS, devemos cada vez mais conversar sobre nossas construções de
masculino e feminino em nossa sociedade. O
jiu-jitsu se inclui nessa responsabilidade por se enquadrar num instrumento de
formação humana informal. Essas situações estão acontecendo nos tatames de todo
o país. Devemos, professores e alunos conversarmos sobre ou pensarmos em
estratégias para encarar o problema.
São colegas que
precisam, como primeiro passo, identificar e se conscientizar que este tipo de
masculinidade afeta seus círculos de relação. Precisam parar de rivalizar ou
menosprezar sua própria dor e a dor do outro por achar que isso afeta como ele
vai ser visto por todos.
Mas para perceber isso
eles também precisam de pessoas de confiança que possam identificar e conversar
sobre o assunto. Existem grupos de homens que se reúnem para conversar sobre o
tema, e sites que
disponibilizam vídeos e textos para compreender
melhor todas as nuances envolvidas na masculinidade hegemônica.
Portanto, já está na
hora de colocarmos em pauta na Arte suave discussões que nos fará olhar para
como tratamos o outro, mesmo que isso nos coloque numa situação incômoda, como o
silêncio sofrido das nossas colegas de treino diante de algumas demonstrações
dessa masculinidade horrível. Podemos ser diferente.
Um comentário:
Theresa v. Pragmatic Play - JTM Hub
Theresa v. Pragmatic Play. Theresa v. 김제 출장샵 Pragmatic Play. This action-packed 안양 출장마사지 video slot features a 5×5 grid with 보령 출장안마 wild 성남 출장샵 substitutions. 순천 출장안마
Postar um comentário