segunda-feira, 18 de junho de 2018

BRASILEIROS FURAM A FILA DA VERGONHA NA RUSSIA


Quem nunca ouviu aquela breve e preocupada dica dos parentes antes de ir visitar a casa de algum amigo da família: – Se comporte na casa dos outros!? Alguns torcedores brasileiros que foram assistir aos jogos na Rússia, aparentemente, estão seguindo bem essa orientação da pátria canarinha. Neste domingo (17) alguns vídeos foram viralizados nos aplicativos de mensagens (Você pode assistir aqui), mostrando torcedores brasileiros cercando uma jovem russa, entoando uma canção como uma torcida organizada, “Bu.... rosa”. A moça, se mostrando gentil aos visitantes e sinalizando não entender do que se trata, participa ingenuamente desse escárnio.

O amigo leitor deve estar se perguntando: Como assim estão seguindo bem a orientação da pátria canarinha? Talvez você não se lembre que há pouco tempo, foi necessário fazer uma campanha entre jornalistas da mídia esportiva para denunciar os assédios sofridos durante as coberturas das partidas dos campeonatos, nas capitais ou não do Brasil (confira a matéria aqui). Atitudes como essa são ainda muito “naturais” no nosso país. É só observar a quantidade de pessoas que comentam que expor uma manifestação de machismo e assédio é puro “mimimi”, que o mundo está ficando chato. Tá sim, afinal, somos o quinto país que mais mata mulheres no mundo. 

Deve estar ficando ainda mais chato. A “brincadeira” dos, aparentemente, rapazes de classe média /classe alta da nossa sociedade, nos leva a pensar no poder simbólico que carrega a expressão linguística utilizada no vídeo. Nosso país é um dos líderes do ranking de cirurgias plásticas em órgãos genitais femininos (matéria aqui). Em 2016 foram 13 mil intervenções cirúrgicas, chamadas de labioplastias ou ninfoplastias (uma forma de corrigir “imperfeições” na vagina) num revezamento entre necessidade e busca de um padrão perfeito, como o que podemos verificar no vídeo do assédio na Rússia ou em páginas feministas que lutam contra mais uma imposição ao corpo feminino. Este movimento da “vagina perfeita” está submetendo mulheres a encarar um processo cirúrgico numa região altamente sensível do corpo.

O nosso (des)governo tentou até ajudar(não nesse caso específico), ou melhor, tentou piorar as coisas. Ao invés de tomar uma postura firme contra a homofobia do país anfitrião, como fizeram nossos vizinhos argentinos que criaram uma vídeo campanha (assista aqui) para mostrar que o futebol é um esporte onde o afeto e demonstrações de carinho masculino é muito forte (coisa que na Rússia é proibido desde 2013), o Itamaraty desenvolveu uma cartilha para orientar a população LGBT de como se comportar nas ruas durante o megaevento futebolístico.

Um chute que passou longe da trave diante do que aconteceu com a moça russa e uma total falta de noção da realidade. Qualquer LGBT brasileiro sabe desde a infância como se comportar num país com ou sem leis homofóbicas. Basta observar a perseguição e o extermínio deles em nossas ruas, a qualquer hora, ou mais precisamente, a cada 19 horas, segundo o Grupo Gay da Bahia. Não se esperava outra coisa de um elenco que participou de uma partida que tirou uma Presidenta democraticamente eleita, “com o supremo e com tudo”, e com uma “pataquada” torcida misógina disparando frases do tipo: Vai tomar no c. Dilma, Jumenta, anta, burra entre outras sandices. Essa bola ou cartilha, melhor dizendo, era para ser passada para os homens Cis mas, pra quê se não fazem nada além do "normal"?   

Por isso é tão importante que o diálogo de gênero e sexualidade seja incluído em nossas escolas, orientando toda população sobre atitudes machistas e suas consequências, quase sempre trágicas. Esse jogo inicia como "brincadeira", mas o final é sempre assédio, estupro e, como nos gritam as estatísticas, termina em morte. Outros “meninos” como os do vídeo na Rússia continuarão a aparecer, seja numa copa do mundo de futebol, seja num mundial de vôlei, de basquete... Eles estão apenas reproduzindo aquilo que aprendem todos os dias em seu país, pois, nossa pátria mãe “gentil”, atarefada com sua jornada tripla de trabalho, ganhando salário menor que os homens e com papeis sociais que impõe toda responsabilidade da educação dos filhos sobre suas costas, também sofre e muito com esses comportamentos.   

Sigamos para nosso próximo adversário, a Costa Rica.  

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