sábado, 8 de maio de 2010

O esporte pode tudo!!!

Utilizo-me do título do mais recente livro do professor Vitor Marinho de Oliveira para refletir sobre o movimento das Conferências Municipais de Esporte que aconteceram em praticamente todo o país e que conta com a sua terceira edição. O livro faz parte da nova coleção questões da nossa época e “integra os projetos comemorativos dos 30 anos da Cortez Editora”

Já a III Conferência do Esporte é fruto da política do governo, oriunda do aconselhamento do Banco Mundial e que objetiva o propósito de democratizar o debate em torno do esporte e da sua função social. A forma encontrada pelo organismo internacional para a aproximação do estado com a sociedade civil foi o modelo das conferências, que aconteceram não só em relação ao esporte, mas, também, em relação à comunicação, à educação entre outros.

No que diz respeito ao esporte, a impressão que fica lendo alguns documentos e ouvindo algumas explanações sobre o mesmo é de que realmente, tal como expressa o título do livro já citado, o esporte pode tudo!!! Fenomenologicamente, colocamos o mesmo “entre parênteses”, e o analisamos de forma isolada, descontextualizada “de todo o processo histórico que o produz” e reproduz, “deixando de lado as condições materiais de sua existência”.

Nesse sentido, um discurso humanista de cunho existencial cola no esporte aspectos sociais que intrínseca e imediatamente não é função do mesmo. Para além do seu caráter lúdico e agonista, o mesmo assume a função de tirar as crianças e jovens das drogas, “é eficaz no processo de ressocialização, é prática democrática, proporciona saúde, combate a violência, reintegra deficientes físicos”, etc, etc. Um verdadeiro elixir salvacionista, receita e remédio para todos os males da sociedade capitalista.

A Universidade Federal de Goiás, através dos pesquisadores do GEPELC (Grupo de Estudo e pesquisa de esporte, lazer e comunicação) vem analisando os documentos produzidos na primeira e na segunda Conferências Nacionais do Esporte e o que eles tem encontrado se caracteriza como uma “avalanche semântica” onde “um conjunto de funções, de atribuições, de qualidades são coladas ao esporte (...)”.

É o esporte enquanto “desenvolvimento humano”, como “promotor da qualidade de vida”, da “cidadania”, o esporte como “ferramenta da paz”,toda uma gama de atributos e qualidades que apresentadas “entre parênteses” só contribuem para a mistificação do próprio esporte e de todos esses elementos colados ao mesmo.

Nesse sentido, destituído de qualquer referência sócio-histórica, passamos a pensar as políticas públicas de esporte e lazer descoladas tanto da política quanto do público, transformando o objetivo democrático das Conferências em democratismo, puro sofismas, falácias, verdadeiro exercício ideológico no sentido clássico do termo, de falseamento da consciência.

Para irmos de encontro a esses e outros fatores, sugiro que façamos um esforço de estudo e análise sobre o que está prescrito nas leis que regem o esporte e nas formulações presentes nos documentos das Conferências já realizadas e cotejemos com a realidade concreta do nosso país, explicitada, dentre outros, no documento Habitat, da ONU (Organização das Nações Unidas) divulgado no dia 2 de março e que aponta o Brasil como o país mais desigual da América Latina, onde os 10% mais ricos da população controlam 50,6% das riquezas do país, enquanto que os 10% mais pobres detêm apenas 0,8%. Isso tudo apesar do Brasil ser hoje a oitava maior economia do mundo.

Para aqueles que acham que esses dados são apenas para economistas e sociólogos, sugiro então que se debrucem apenas sobre os documentos das Conferências e analisem, tomando os mesmos como referências, o que foi realmente realizado e que setores foram mais privilegiado no desenvolvimento das políticas de esporte dos governos.

Helvétius, nos ensina o Vitor Marinho, no bojo da revolução burguesa, afirmou que a educação pode tudo. O desenvolvimento histórico demonstrou que nem tanto e interrogou sobre de qual educação se tratava. Aprendamos com a história e interroguemos: o esporte pode tudo? De qual esporte estamos falando? Para quem praticar? Sobre quais estruturas e modo de produção e reprodução da existência? Esporte para todos ou esporte para poucos?

7 comentários:

Marcelo "Russo" Ferreira disse...

É, camarada Wellington...
E quando escutamos os discursos de gestores em aberturas de Conferências, como foi aqui no Pará, aí é que percebemos que este "elixir" da vida - o esporte - assoberba a mente pública brasileira... Aí, vira droga!
Sempre acompanhando suas aulas no Esporte em Rede.
Abraços
Há braços!
Marcelo Russo

Michael Ramos disse...

Caro, Wellington...
seu texto me faz lembrar uma discussão colocada pelo professor Lino, sobre as políticas públicas.
Onde existe uma discrepância enorme no que diz respeito ao percentual de verba pública destinada ao "esporte educacional" em vista ao "esporte rendimento", ou seja, não adianta discutir "democráticamente" políticas públicas para o esporte se não invertermos a lógica e prioridade das próprias políticas.
Pois ai estaremos mais uma vez distribuindo o dinheiro público nas mãos de poucos....
Michael Ramos

Ana Mesquita disse...

Um monte de coisas sobre as quais tenho refletido, encontrei no seu texto! Vou procurar o livro!

Welington disse...

Obrigado russo, ana e michael pela participação de vcs.

PAULO KRAIDE PIEDADE (PAULOFILÉ) disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
PAULO KRAIDE PIEDADE (PAULOFILÉ) disse...

Prof. Welington

A discussão deve ser a tônica para chegarmos à verdade e aos melhores caminhos para os recursos aplicados ao esporte.
Porém, há de se qualificar as Conferências Municipais. Exigir das cidades que se estabeleça uma verdadeira discussão em prol do esporte. Na ponta da cadeia, no munícipe que espera a contra partida do Estado nesse aspecto.
Um pouco mais além, soube recentemente que numa cidade de porte na região de Campinas, alguém "esqueceu" de divulgar internamente que haveria a Conferência Estadual e para garantir a participação da cidade, "fabricaram" uma ata, com base na do ano anterior...sem comentários!
Assim, não chegaremos a resultado algum, ou seja, a participação popular, o suporte acadêmico e vontade política, podem realizar uma evolução considerável nesse aspecto. Mas, creiam será uma longa caminhada, que, já começamos há algum tempo...ótimo tema!

Forte abraço e andei meio sumido por estar desenvolvendo um novo projeto (voltado para TV à cabo)... e colocamos "O FILÉ DOS ESPORTES" no ar... mostrando um pouco do que rola na nossa região.
Maiores detalhes no BLOG...
Mas, tô sempre no pedaço!

PAULOFILÉ

Welington disse...

Valeu, Filé. Seus comentários são sempre bem vindos. Esse acontecimento em Campinas deve ser divulgado amplamente pois demonstra uma outra da mesma faceta do democratismo.