Welington - Você entra em 2007, né?
Meriva - 2007/2008.
Welington - Você sabe quando a bamor é criada?
Meriva - A torcida organizada ela foi criada na década de 60, 70. Os verdadeiros presidentes são uns caras de cinqüenta anos, de quarenta anos que não tem nada a ver com isso, só que tem o lado da malandragem, é só ladrão na torcida, só ladrão mesmo, os caras que querem baderna, bagunça, esse foi o lado que eu me misturei mesmo, e isso sobe pra cabeça. Tinha um do nono distrito que trabalhava no colégio cefet...
Welington - Como é essa coisa de ditrito? Primeiro, segundo, sexto...
Meriva - Cada bairro tem a sua sede.
Welington - Distrito diz respeito ao bairro.
Meriva - É. O bairro da federação é vigésimo segundo. Tem um aluno seu aqui que é lá da federação, do vigésimo segundo. Centro é sexto, lá pro lado do ICEIA, barbalho, é nono.
Welington - Tem algum regimento pras torcidas organizadas, um estatuto?
Meriva – Tem, tem um estatuto sim, o estatuto do torcedor...
Welington – Mas o estatuto do torcedor é de uma forma mais geral. Eu digo internamente, pras torcidas organizadas. No caso da bamor, ela tem seu estatuto, os imbatíveis tem seu estatuto específico?
Meriva – Tem, cada torcida tem o seu estatuto, mas...como se subisse pra cabeça, a malandragem, ninguém respeita. Cada torcida tem. Cada torcida é aliada com uma, como a bamor é com a mancha verde, que a sede é em vilas do atlântico. Quem ta lá dentro acha uma maravilha, se acha um miserável. Hoje, que eu tô aqui fora eu vejo que eu arrisquei muito, muito, muito minha vida.
Welington - Você era da facção da mancha verde?
Meriva - Eu era.
Welington - Você era do sexto distrito?
Meriva - Da bamor. Todos os distritos tem relação com a mancha, com a torcida azul, que é do cruzeiro. Tem relação com a torcida de Curitiba. Tive a oportunidade de conhecer lá em curitiba a torcida organizada e São Paulo e Salvador não superam não, Curitiba é bem pior. Eles fecham o centro quando joga Curitiba e atlético paranaense. A polícia não se mete. Muda a frota de ônibus, muda a frota dos carros, o centro é fechado pra eles brigarem entre si, lá em Curitiba. Os caras são doentes. Só tem aquela roupa, pintam o cabelo de verde mesmo, é incrível.
Welington - Interessante. Você geralmente associa a violência a essa relação da falta de oportunidade, da miséria, mas Curitiba é diferente de Salvador em relação a qualidade de vida, desenvolvimento humano. Mas hoje você ta fora, né?
Meriva - Tô fora da torcida hoje, todas as torcidas.
Welington – Em dia de jogo você vai para o estádio. Como é sua relação com as torcidas, como é você como uma espectadora igual aos outros em relação a duas torcidas, uma que você fez parte e a outra que você bateu?
Meriva – Eu falo com todo mundo, inclusive da outra torcida, mas eu fico com outra platéia, eu não arrisco nem a ir com a camisa do time. Torcida as pessoas não é só metida com a coisa de torcida. Muita gente metida com tráfico. Amigo meu apareceu em bocão, metido com tráfico de droga da torcida organizada. Amigo meu e de júnior. São muitos metidos com tráfico de drogas, consegue porte de arma, bomba caseira. Eu fico do outro lado do estádio. Quando teve o jogo do palmeiras e vitória eu fui sozinha pra ver o palmeiras. Eu fui com a camisa do palmeiras. Mas sempre tem aquelas piadinhas. Eu era a única de palmeirense dentro do ônibus. Só tinha gente da TUI, só tinha gente com a camisa do vitória. Eu saltei na Garibaldi. Ninguém falou nada até o momento que eu saltei, foram falar, o sangue subiu, entrei no ônibus pra pegar a camisa do cara.
Welington - Pra pegar a camisa?
Meriva - Do vitória. Por que ele pegou e botou a cara pra fora e fez assim: da próxima vez eu tomo sua camisa, viu mãe? Eu falei, eu vou tomar é a sua agora. O sinal fechou eu pulei na janela e rasguei a camisa dele. Eu fiz: quem foi que tomou a camisa agora? As vezes, assim, ainda sobe, mas eu larguei a torcida logo quando eu descobri a arte marcial. Eu tive que largar a torcida organizada. Ainda me pedem pra voltar, só que eu falo pra eles que já botei um ponto final nessa história, eu não volto. Não leva a nada, aí vai ficar sempre lá e cá. Mata uns da bamor, eles matam um da TUI. Vai ficar sempre nessa, sobre pra cabeça mesmo.
Welington – Você ver alternativa? Você acha que isso termina, não termina? Você tem alguma idéia pra acabar isso?
Meriva – Rapaz, é como diz a letra de uma música, você mata um ladrão aí nasce outro, vai ser sempre assim. Você mata um, mas já vem outro, pequenininho já, desde pequenininho. Eu tenho exemplos em casa de torcedores doentes pelo Bahia na minha família. Meu primo quase separa da esposa por causa do Bahia. Meu irmão é doente pelo Bahia. Pra mim hoje se perder, perdeu, se ganhar, ganhou. Eu me afastei do futebol. Por que? É o que eu ando conversando com eles, quando eu encontro pelo MSN, no orkut, mesmo assim por orkut eu converso por depoimento, nem me arrisco recados para as pessoas verem na página. Eu falei você estão aí, se matando, matando um ao outro enquanto eles lá, depois que terminam ba-vi, vão todos comer água na casa dos jogadores do vitória. Mostrou isso na televisão. Terminou o jogo do ba-vi teve festa na casa do goleiro do vitória. O Bahia todo tava lá. Tudo fazendo festa e eles se matando, a torcida organizada um matando outro, eu falei você tão ai matando um, aí mata outro, eles lá fazendo festa. Essas coisas são muito contraditórias, eles não levam mais pela questão do time. Agora time é uma coisa, o Bahia é outro e a torcida organizada é outra coisa.
Welington – Vira pessoal, né?
Meriva - Vira pessoal. Tanto é que passa reportagem a torcida da bamor agredindo jogadores do Bahia, como é que pode isso? Virou uma coisa muito pessoal agora. Torcida organizada é uma coisa separada do time. Eu acho que a polícia deveria tomar um jeito. Eu acho que nem a polícia tá conseguindo segurar as torcidas organizadas. Cada vez mais tá ocupando Salvador. Eu to vendo um menino lá na minha rua, que eu vi criança, onze anos, já tá com a camisa da bamor, já tá fazendo e acontecendo.
Welington – Mais do que regredir você tá vendo ampliando?
Meriva - Tá ampliando cada vez mais. Minha sobrinha me disse esse final de semana...por isso eu quero fazer o concurso da polícia. Civil e militar. Minha sobrinha virou pra mim e disse, deixa eu fazer 18 anos, você vai ver, eu vou ser dos imbatíveis. Aí eu falei, eu vou ser a primeira a bater em você, você vai tá com dezoito já, eu vou poder bater em você. Eu não quero saber de você em torcida organizada.
Welington – Mas ela sabe que você fez parte?
Meriva - Sabe, minha família sabe que eu fiz parte de torcida organizada.
2 comentários:
Então se combate violência com violência, é? Entendi bem? Enquanto membro de uma torcida organizada eu sofro a repressão da polícia e desenvolvo um querer ser policial para descontar também, nem que para isso eu precise bater em um membro da minha família. Entendi bem? É isso mesmo?
Welington. Parabéns pela entrevista. è bom ter acesso a leituras de pessoas que viveram por dentro este fenômeno da violência das torcidas organizadas. É curioso este aspecto apontado por Miralva, tá bem dentro da máxima de que violência só gera violência.
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