segunda-feira, 18 de junho de 2018

BRASILEIROS FURAM A FILA DA VERGONHA NA RUSSIA


Quem nunca ouviu aquela breve e preocupada dica dos parentes antes de ir visitar a casa de algum amigo da família: – Se comporte na casa dos outros!? Alguns torcedores brasileiros que foram assistir aos jogos na Rússia, aparentemente, estão seguindo bem essa orientação da pátria canarinha. Neste domingo (17) alguns vídeos foram viralizados nos aplicativos de mensagens (Você pode assistir aqui), mostrando torcedores brasileiros cercando uma jovem russa, entoando uma canção como uma torcida organizada, “Bu.... rosa”. A moça, se mostrando gentil aos visitantes e sinalizando não entender do que se trata, participa ingenuamente desse escárnio.

O amigo leitor deve estar se perguntando: Como assim estão seguindo bem a orientação da pátria canarinha? Talvez você não se lembre que há pouco tempo, foi necessário fazer uma campanha entre jornalistas da mídia esportiva para denunciar os assédios sofridos durante as coberturas das partidas dos campeonatos, nas capitais ou não do Brasil (confira a matéria aqui). Atitudes como essa são ainda muito “naturais” no nosso país. É só observar a quantidade de pessoas que comentam que expor uma manifestação de machismo e assédio é puro “mimimi”, que o mundo está ficando chato. Tá sim, afinal, somos o quinto país que mais mata mulheres no mundo. 

Deve estar ficando ainda mais chato. A “brincadeira” dos, aparentemente, rapazes de classe média /classe alta da nossa sociedade, nos leva a pensar no poder simbólico que carrega a expressão linguística utilizada no vídeo. Nosso país é um dos líderes do ranking de cirurgias plásticas em órgãos genitais femininos (matéria aqui). Em 2016 foram 13 mil intervenções cirúrgicas, chamadas de labioplastias ou ninfoplastias (uma forma de corrigir “imperfeições” na vagina) num revezamento entre necessidade e busca de um padrão perfeito, como o que podemos verificar no vídeo do assédio na Rússia ou em páginas feministas que lutam contra mais uma imposição ao corpo feminino. Este movimento da “vagina perfeita” está submetendo mulheres a encarar um processo cirúrgico numa região altamente sensível do corpo.

O nosso (des)governo tentou até ajudar(não nesse caso específico), ou melhor, tentou piorar as coisas. Ao invés de tomar uma postura firme contra a homofobia do país anfitrião, como fizeram nossos vizinhos argentinos que criaram uma vídeo campanha (assista aqui) para mostrar que o futebol é um esporte onde o afeto e demonstrações de carinho masculino é muito forte (coisa que na Rússia é proibido desde 2013), o Itamaraty desenvolveu uma cartilha para orientar a população LGBT de como se comportar nas ruas durante o megaevento futebolístico.

Um chute que passou longe da trave diante do que aconteceu com a moça russa e uma total falta de noção da realidade. Qualquer LGBT brasileiro sabe desde a infância como se comportar num país com ou sem leis homofóbicas. Basta observar a perseguição e o extermínio deles em nossas ruas, a qualquer hora, ou mais precisamente, a cada 19 horas, segundo o Grupo Gay da Bahia. Não se esperava outra coisa de um elenco que participou de uma partida que tirou uma Presidenta democraticamente eleita, “com o supremo e com tudo”, e com uma “pataquada” torcida misógina disparando frases do tipo: Vai tomar no c. Dilma, Jumenta, anta, burra entre outras sandices. Essa bola ou cartilha, melhor dizendo, era para ser passada para os homens Cis mas, pra quê se não fazem nada além do "normal"?   

Por isso é tão importante que o diálogo de gênero e sexualidade seja incluído em nossas escolas, orientando toda população sobre atitudes machistas e suas consequências, quase sempre trágicas. Esse jogo inicia como "brincadeira", mas o final é sempre assédio, estupro e, como nos gritam as estatísticas, termina em morte. Outros “meninos” como os do vídeo na Rússia continuarão a aparecer, seja numa copa do mundo de futebol, seja num mundial de vôlei, de basquete... Eles estão apenas reproduzindo aquilo que aprendem todos os dias em seu país, pois, nossa pátria mãe “gentil”, atarefada com sua jornada tripla de trabalho, ganhando salário menor que os homens e com papeis sociais que impõe toda responsabilidade da educação dos filhos sobre suas costas, também sofre e muito com esses comportamentos.   

Sigamos para nosso próximo adversário, a Costa Rica.  

domingo, 17 de junho de 2018

O futebol ficou na Vuitton

A Seleção Brasileira estreou hoje na Copa do Mundo na Rússia contra a Seleção da Suíça e o resultado de 1 x 1 não foi bem recebido pela mal chamada "pátria de chuteira". O fato foi que o time deixou muito a desejar, principalmente após o gol sofrido logo no início do segundo tempo.

Muitos colegas acreditavam em uma estréia triunfante da seleção canarinho. O otimismo estava presente nos palpites em relação ao placar do jogo que giravam em torno de três gols ou mais. O Brasil estrearia bem e daria uma goleada na seleção dos famosos alpes da região do Tirol.

Não foi assim. A indiscutível capacidade técnica dos comandados do Tite não conseguiu ser traduzida em resultado positivo. Não que um empate contra uma seleção que só perdeu uma das suas 23 últimas partidas tenha sido ruim. Apenas não atendeu às expectativas da massa tupiniquim.

Quem deixou muito a desejar foi o craque Neymar que parece ter deixado o seu futebol na mala de 6 mil reais que ostentou ao desembarcar do ônibus em direção a Arena Rostov ou na bolsa da Louis Vuitton, de 18 mil reais.

Resta o consolo do país que é o décimo quarto em desigualdade social, que só em 2016 matou violentamente mais de 62 mil e 500 potenciais torcedores canarinhos, nos tropeços das também candidatíssimas ao título da Copa do Mundo, as seleções da Alemanha, Argentina e Espanha.

quinta-feira, 14 de junho de 2018

Raízes na periferia: um raio-x da origem social dos convocados para a Copa 2018

Pés descalços, campinho de terra batida. A periferia ainda é o maior celeiro de talentos do futebol brasileiro. É o que demonstra um levantamento feito pela reportagem do Brasil de Fato, baseado em imagens de arquivo, sínteses de entrevistas e relatos dos jogadores e familiares, concedidos ao longo da carreira.

A maioria dos jogadores convocados pelo técnico Tite para a Copa do Mundo 2018 vêm da região metropolitana de grandes centros urbanos das regiões Sul e Sudeste, de municípios interioranos distantes da capital, sem infraestrutura adequada, ou de bairros com altos índices de criminalidade e baixos indicadores sociais.

São, de modo geral, filhos de trabalhadores braçais, mal remunerados, com anos de escolaridade inferiores à média brasileira. Só não seguiram o mesmo caminho dos pais devido ao esporte.

Mesmo no mundo do futebol, eles são exceção. Cerca de 82% dos jogadores profissionais brasileiros ganham menos de R$ 1.000 por mês.

Dos 23 convocados para a Copa, 19 jogam em grandes clubes da Europa. Todos recebem mais de cem salários mínimos, entre remuneração fixa, direitos de imagem e patrocínios. Embora acentuem o problema da concentração de renda no país, hoje eles têm condições de ajudar a família e os amigos da “quebrada” – o que reforça o papel do futebol como ferramenta de mobilidade social nos países em desenvolvimento.

Conheça a origem e os primeiros passos de cada um deles:

GOLEIROS

Alisson (Novo Hamburgo-RS, 2 de outubro de 1992)

Cresceu em um apartamento simples no loteamento Mundo Novo, um dos maiores conjuntos de habitacionais do Brasil, com 1,2 mil casas – que sequer tinha posto de saúde até 2012. O Mundo Novo fica no bairro Canudos, que tem o segundo maior índice de criminalidade do município.

Para treinar nas categorias de base do Internacional, Alisson precisava pegar carona em uma van na rodovia BR-116, que liga Novo Hamburgo a Porto Alegre. Descendente de uma extensa linhagem de goleiros, que começou há quatro gerações, ele foi apenas o segundo a se profissionalizar e contribuir no orçamento familiar por meio do esporte. O primeiro foi o irmão mais velho, Muriel, que hoje atua no Belenenses, de Portugal.

Clubes: Internacional e Roma (Itália).

Cássio (Veranópolis-RS, 6 de junho de 1980)

O gigante de 1,95m cresceu em um casebre de madeira a 170 km de Porto Alegre.

Sobrinho do então massagista do Veranópolis Esporte Clube (VEC), Cássio assistia a todos os treinamentos do time e passava horas buscando as bolas que os jogadores chutavam para fora do campo. Gandula-mirim, aos seis anos, ele conheceu o técnico Tite, da Seleção Brasileira, que era treinador do VEC em 1993.

O primeiro trabalho remunerado, aos 14 anos, foi em um lava-jato.

Após fazer sucesso debaixo das traves, construiu uma casa moderna e confortável para a família ao lado daquela em que passou a infância.

Clubes: Grêmio, PSV (Holanda), Sparta Roterdã (Holanda) e Corinthians.

Ederson (Osasco-SP, 17 de agosto de 1993)

Primeiro jogador da história da Seleção a ser convocado para uma Copa sem nunca ter atuado profissionalmente no Brasil, Ederson foi criado na periferia de Osasco. O bairro Rochdale, de classe média baixa, era conhecido pelas enchentes e alagamentos.

Apaixonado por tatuagens, o garoto desenhava o corpo com caneta desde a infância. Hoje, são mais de 30 tatuagens – todas de verdade.

Ederson jogava bola na rua e, aos 10 anos, matriculou-se na escolinha do bairro. Teve 15 minutos para mostrar serviço aos olheiros do São Paulo, em meio a 150 garotos, e logo chamou a atenção.

Transferiu-se para Portugal antes de chegar à categoria profissional, e hoje vive em Manchester em uma mansão com a esposa, a filha, a sogra, um amigo de infância e um casal de amigos.

Clubes: Ribeirão (Portugal), Rio Ave (Portugal), Benfica (Portugal) e Manchester City (Inglaterra).

ZAGUEIROS

Marquinhos (São Paulo-SP, 14 de maio de 1994)

Cria do Centro de Formação e Treinamento de Atletas – Futebol SACI, que fica no bairro Imirim, Zona Norte de São Paulo, Marquinhos era o terceiro de cinco irmãos. Estreou como goleiro, mas já na infância mudou de posição dentro do campo.

Aos oito anos, o garoto da periferia paulistana chamou a atenção dos olheiros do Corinthians no “terrão” – campo de terra batida, esburacado, onde o clube fazia testes para crianças e adolescentes.

No bairro e na família onde cresceu, a bola parecia a única saída. O primo, Moreno, e o irmão, Luan, haviam sido revelados pela base do Corinthians. Mas Marquinhos foi quem mudou a vida da família com o futebol: Moreno está sem clube e Luan, que não engrenou como profissional, hoje administra a carreira do zagueiro da Seleção.

Clubes: Corinthians, Roma (Itália) e Paris Saint-Germain (França).

Miranda (Paranavaí-PR, 7 de setembro de 1984)

Formado na escolinha de futebol da Associação de Moradores do Jardim São Jorge, bairro de 25 mil habitantes na periferia de Paranavaí-PR, Miranda é o caçula de 12 filhos. Ele escolheu ser zagueiro em homenagem ao irmão mais velho, Vicente, que morreu carbonizado após acidente de trabalho em uma companhia de energia local. Era na zaga que o irmão gostava de jogar.

Miranda morava a poucos metros de um campinho, onde todos os dias jogava bola com os amigos. Foi revelado em torneios de várzea.

Clubes: Coritiba, Sochaux (França), São Paulo, Atlético de Madrid (Espanha) e Internazionale (Itália).

Pedro Geromel (São Paulo-SP, 21 de setembro de 1985)

O zagueiro-sensação do Grêmio viveu até a adolescência com a família em Vila Maria, bairro de classe média da Zona Norte da capital paulista. Sem chances nos clubes de São Paulo, Geromel quase desistiu do futebol para trabalhar como bancário.

A origem social de Pedro Geromel é uma exceção entre os jogadores convocação para a Seleção. Ele é um dos únicos que cresceu em uma família de classe média alta – o pai tem uma empresa de embalagens plásticas na capital paulista. É fluente em inglês, alemão e espanhol.

Clubes: Chaves (Portugal), Vitória de Guimarães (Portugal), Colônia (Alemanha), Mallorca (Espanha), Grêmio.

Thiago Silva (Rio de Janeiro-RJ, 22 de setembro de 1984)

Criado no bairro Santa Cruz, Zona Oeste do Rio, a 100 metros da entrada da favela. Era uma criança apaixonada por soltar pipa e jogar futebol, e convivia com tiroteios entre policiais e moradores da comunidade.

A mãe vivia com medo. Para brincar na rua, ele esperava que ela cochilasse, depois do almoço, e saía de fininho para se juntar aos amigos.

Como zagueiro, foi rejeitado nas “peneiras” de cinco clubes do Rio de Janeiro. A primeira oportunidade como profissional veio em Alvorada-RS, a 1,5 mil km de casa.

Em 2005, na Rússia, teve um diagnóstico de tuberculose, foi hospitalizado em condições precárias e quase perdeu parte do pulmão.

Clubes: RS Futebol, Juventude, Porto B (Portugal), Dínamo Moscou (Rússia), Fluminense, Milan (Itália) e Paris Saint-Germain (França)

LATERAIS

Danilo (Bicas-MG, 15 de julho de 1991)

O pai de Danilo, caminhoneiro, conseguiu que o filho tivesse oportunidade de treinar em uma escolinha de futebol de Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira. De origem humilde, o lateral saía da escola, às vezes só com uma bolacha no estômago, e seguia para o treino, a 40 km de casa, no município de Bicas.

Depois de chamar atenção de grande clubes mineiros, Danilo foi contratado pelo Santos, marcou o gol do título da Libertadores da América em 2011 e, de lá, rumou para o futebol da Europa.

A família ainda vive em Bicas, e o jogador não esquece das dificuldades da infância. Durante as férias, Danilo sempre visita a escolinha de futebol onde começou a jogar, no bairro Novo Triunfo.

Quando postou uma foto no Instagram com um tênis de marca, um dos seus seguidores disse ter adorado o tênis, mas lamentou não ter condições de comprá-lo. Danilo se identificou: “Fala irmão! Tô ligado. Também sou de ‘quebrada’. Manda aí seu endereço e quanto você calça. Vou te mandar uns pisantes! Valeu”.

Clubes: América Mineiro, Santos, Porto (Portugal), Real Madrid (Espanha) e Manchester City (Inglaterra).

Fagner (São Paulo-SP, 11 de junho de 1989)

Descoberto em uma escolinha de futebol próximo ao Jardim Capelinha, um dos bairros mais violentos de São Paulo. Foi criado pelo pai e cresceu longe da mãe, depois de um divórcio traumático.

Aos seis anos, sofreu um acidente numa porta de vidro e quase teve o braço amputado, por um erro médico. O pai teve que vender o carro para pagar a cirurgia de correção. A primeira das muitas tatuagens que ele tem foi feita para esconder aquela cicatriz.

Fagner chegou ao Corinthians com nove anos. Pegava dois ônibus, um metrô e caminhava mais de uma hora até o Parque São Jorge para realizar o sonho de ser jogador de futebol.

Clubes: Corinthians, PSV (Holanda), Wolfsburg (Alemanha), Vasco e Corinthians.

Marcelo (Rio de Janeiro-RJ, 12 de maio de 1988)

Revelado na escolinha de futsal da colônia de férias do Exército, na Urca. Quando foi aprovado nas categorias de base do Fluminense, o avô o levava de carro para Xerém em um Fusca 1975, comprado no ano 2000 com dinheiro ganho no jogo do bicho.

No começo da carreira o dinheiro era contado e, às vezes, não dava sequer para tomar uma condução ou almoçar antes do treino.

Clubes: Fluminense e Real Madrid (Espanha).

Filipe Luís (Jaraguá do Sul-SC, 9 de agosto de 1985)

Cresceu na zona rural de Massaranduba, município de 14,6 mil habitantes do interior de Santa Catarina. Os passatempos preferidos do jogador na infância estavam ligados à terra: comer frutas nas árvores, pegar minhoca do chão, passear pelas plantações de arroz.

Começou a bater bola atrás da igreja da comunidade. Quando se mudou para Jaraguá do Sul, na adolescência, passeava de bicicleta de colégio em colégio para jogar futebol. Foi revelado em um torneio de futsal, aos 14 anos, e passou a integrar as categorias de base do Figueirense.

Morava debaixo da arquibancada do estádio Orlando Scarpelli, com outros 30 garotos.

Clubes: Figueirense, Ajax (Holanda), Real Madrid Castilla (Espanha), La Coruña (Espanha), Atlético de Madrid (Espanha), Chelsea (Inglaterra) e Atlético de Madrid (Espanha).

MEIO-CAMPISTAS

Paulinho (São Paulo-SP, 25 de julho de 1988)

Começou nos campos de várzea do Parque Novo Mundo, na região da Vila Maria, Zona Norte de São Paulo. Aos 12 anos, fazia parte da categoria de base da Portuguesa.

O padrasto, que Paulinho considera um pai, era quem o levava para assistir aos jogos de futebol.

Os pais se separam quando o jogador era ainda criança. Paulinho só foi encontrar o pai biológico novamente quando o Corinthians foi a Recife jogar contra o Náutico, em 2012.

Clubes: FC Vilnius (Lituânia), ŁKS Łódź (Polônia), Audax, Bragantino, Corinthians, Tottenham (Inglaterra), Guangzhou Evergrande (China) e Barcelona (Espanha).

Fernandinho (Londrina-PR, 4 de maio de 1985)

Passou a infância e adolescência entre duas cidades: Londrina e Ribeirão Preto. Fernandinho era o destaque do time de peladas da Rua do Roncador, no conjunto Lindoia, periferia do município paranaense. Ele também era o número 1 do campinho de terra batida no bairro Adão do Carmo Leonel, na zona Oeste de Ribeirão Preto.

Foi revelado em 1999, aos 13 anos, no PSTC – centro de treinamento especializado em categorias de base e formação de atletas profissionais de Londrina. Treinava no campo de futebol da Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Até hoje, Fernandinho mantém contato com os amigos do Conjunto Lindoia.

Clubes: Atlético Paranaense, Shakhtar Donetsk (Ucrânia) e Manchester City (Inglaterra).

Renato Augusto (Rio de Janeiro-RJ, 8 de fevereiro de 1988)

Renato Augusto cresceu em três apartamentos diferentes na rua Ibituruna, a menos de 1 km do Maracanã. Via o estádio de segunda à sexta pela janela do ônibus 456, que pegava para ir à escola. Hoje, ele traz o Maracanã estampado em uma tatuagem no braço direito.

Assim como o zagueiro Pedro Geromel, Renato Augusto é um dos poucos convocados para a Copa oriundo de uma família de classe média.

Clubes: Flamengo, Bayer Leverkusen (Alemanha), Corinthians e Beijing Guoan (China).

Fred (Belo Horizonte-MG, 5 de março de 1993)

Cresceu no Jardim Europa, em Venda Nova, Belo Horizonte, jogando bola na rua, descalço. Na Copa de 2002, raspou o cabelo igual ao do ídolo Ronaldo, artilheiro da Seleção.

Foi aprovado em um teste no Atlético Mineiro aos dez anos, mas teve que abrir mão de jogar no time do coração porque não conseguiu um contrato que garantisse verba de transporte, moradia e alimentação.

Meses depois, foi levado a Porto Alegre em um projeto encabeçado pelo ex-jogador Assis, irmão de Ronaldinho Gaúcho, que lhe abriu as portas no Internacional.

Clubes: Internacional e Shakhtar Donetsk (Ucrânia).

Casemiro (São José dos Campos-SP, 23 de fevereiro de 1992)

Foi abandonado pelo pai aos três anos e passou necessidade durante toda a infância. Entre as lembranças mais vivas daquela época, está a imagem de uma vendedora de Yakult que passava em frente à casa dele todo final de tarde: Casemiro morria de vontade de tomar a bebida, mas a mãe não tinha dinheiro para comprar.

Aprovado em um teste no São Paulo, ele não tinha condições de ir e voltar de São José dos Campos à capital, e dependia da ajuda de amigos para passar a noite entre um e outro treinamento. Na mesma época, contraiu uma hepatite e ficou quase 90 dias sem treinar. Quase foi forçado a desistir do esporte.

Aos 14 anos, conseguiu uma vaga no alojamento do clube, driblou as dificuldades e hoje é considerado uma das maiores revelações da história do Tricolor.

Clubes: São Paulo, Real Madrid B (Espanha), Porto (Portugal) e Real Madrid (Espanha)

Willian (Ribeirão Pires-SP, 9 de agosto de 1988)

Cresceu jogando futebol na rua Conde de Sarzedas, no bairro Vila Albertina, no ABC paulista. Era conhecido de todos moradores e comerciantes da rua: volta e meia a bola entrava pela porta ou batia em uma janela.

Os primeiros treinos, aos cinco anos, foram na quadra de futsal do pequeno Ribeirão Pires FC.

A carreira deslanchou quando o pai, Severino da Silva, o levou para um teste na escolinha do ex-jogador Marcelinho Carioca. Era o primeiro passo para que Willian vestisse a camisa do Corinthians, time do coração de Seu Severino.

Clubes: Corinthians, Shakhtar Donetsk (Ucrânia), Anzhi (Rússia) e Chelsea (Inglaterra).

Philippe Coutinho (Rio de Janeiro-RJ, 12 de junho de 1992)

Cresceu em um condomínio no Rocha, Zona Norte do Rio. Quem primeiro identificou o talento dele para o futebol foi Dona Didi, avó de um amigo de infância.

Em casa, o dinheiro era contado, mas nunca faltou apoio da família: o pai, a mãe e os dois irmãos mais velhos suaram a camisa para que o menino se dedicasse desde cedo ao esporte.

Coutinho começou aos seis, na escolinha de futsal do Clube dos Sargentos do Rio de Janeiro. Em menos de um ano, foi aprovado no time de Mangueira e disputou o primeiro torneio estadual de futsal. Artilheiro da competição, chamou a atenção do Vasco, clube em que estreou como profissional.

Clubes: Vasco, Internazionale (Itália), Liverpool (Inglaterra) e Barcelona (Espanha).

Douglas Costa (Sapucaia do Sul-RS, 14 de setembro de 1990)

Estudou na escola municipal Hugo Gerdau, em Sapucaia do Sul, região metropolitana de Porto Alegre. Filho de um mecânico e uma dona de casa, foi revelado em caminhos de terra batida. Matriculou-se na escolinha de futebol da Prefeitura e chegou ao Grêmio aos 12 anos.

Nos primeiros meses, causou desconfiança por ser muito mais magro do que a maioria dos colegas. Só conseguiu se firmar nas categorias de base após um trabalho de fortalecimento muscular e nutricional: ganhou seis quilos em dois anos.

Clubes: Grêmio, Shakhtar Donetsk (Ucrânia), Bayern de Munique (Alemanha) e Juventus (Itália)

ATACANTES

Taison (Pelotas-RS, 12 de janeiro de 1988)

Ex-flanelinha, integrante de uma família de onze irmãos, foi o único menino de seu círculo social que conseguiu se estabelecer profissionalmente e ajudar a família. Ao menos dois de seus amigos de infância são hoje moradores de rua, em Pelotas.

O talento de Taison foi desenvolvido em ruas de areia e calçamento, nas periferias do município, e no pátio da Escola Estadual Nossa Senhora dos Navegantes. Descoberto pelo clube Osório, deixou o trabalho de manobrista, em frente a um supermercado, e logo encantou os olheiros do Internacional, clube que o revelou para o mundo.

Clubes: Internacional, Metalist Kharkiv (Ucrânia) e Shakhtar Donetsk (Ucrânia).

Neymar (Mogi das Cruzes-SP, 5 de fevereiro de 1992)

Cresceu em uma casa simples Praia Grande, litoral paulista. A casa era pequena, improvisada, a poucas quadras de um lixão. Os garotos descalços se comportavam como os donos da rua: eram os carros, e não os pedestres, que precisavam pediam licença para passar.

O menino, conhecido na época por “Juninho”, começou a chamar a atenção aos dez anos, no Grêmio Recreativo dos Metalúrgicos de Santos (Gremetal). Após ser descoberto pelo Santos, ainda criança, pegava ônibus sozinho todos os dias para participar dos treinos. A rotina era tão pesada que ele se acostumou a “passar do ponto” de casa, tamanho cansaço.

O primeiro contrato com o Peixe, em maio de 2004, garantia R$ 450,00 por mês à família. Foi graças a essa ajuda de custos que o menino pôde se dedicar somente ao futebol.

Clubes: Santos, Barcelona (Espanha) e Paris Saint-Germain (França).

Roberto Firmino (Maceió-AL, 2 de outubro de 1991)

Único representante do Nordeste na Seleção, Firmino nasceu e foi criado no conjunto habitacional Dique Estrada, região pobre e violenta da capital alagoana.

O primeiro campo foi a rua de paralelepípedo. Os amigos do bairro e das duas escolas em que estudou, Colégio Tarcísio de Jesus e Colégio Caíque, eram os principais companheiros nas peladas.

Quando jovem, vendia coco na praia para ajudar no orçamento da família. Tornou-se profissional no Figueirense, em Florianópolis, a 3,1 mil km de casa. Sem dinheiro para a passagem, ficou mais de um ano sem voltar para Maceió.

Clubes: Figueirense, Hoffenheim (Alemanha) e Liverpool (Inglaterra).

Gabriel Jesus (São Paulo, 3 de abril de 1997)

Cria do Jardim Peri, comunidade pobre de São Paulo. Começou a chamar atenção aos oito anos, no campo de terra do presídio militar Romão Gomes, em Tremembé, Zona Norte de São Paulo. Para ir aos jogos e economizar no combustível, o treinador do time chegou a colocar onze garotos dentro de um Fusca.

Enquanto Neymar e outros companheiros de Seleção disputavam a Copa de 2014, Gabriel Jesus pintava as ruas da comunidade de verde e amarelo. No ano seguinte, ele seria revelado pelo Palmeiras.

O camisa 9 titular de Tite não teve a presença do pai, que abandonou a família quando o craque era ainda pequeno. A mãe, empregada doméstica, colocava comida na mesa para os três filhos.

Às vésperas do Mundial, o rosto do atacante da Seleção estampa o muro da rua onde o garoto cresceu e descobriu o futebol. Ou foi descoberto por ele.

Clubes: Palmeiras e Manchester City (Inglaterra).

MATÉRIA PUBLICADA NA BRASIL DE FATO E NO DIÁRIO DO CENTRO DO MUNDO