sábado, 27 de fevereiro de 2010

Violência das torcidas organizadas

Esta semana mais uma vez fomos informados pelas diferentes mídias sobre atos de violência protagonizados pelas torcidas organizadas dos clubes de futebol do Palmeiras e do São Paulo. Um fenômeno recorrente.

No início deste ano, no mês de janeiro, repercutiu também, embora muito menos do que o evento desta semana em função do mesmo ter ocasionado a morte de pelo menos um torcedor, o confronto entre componentes das torcidas do Guarani e do São Paulo, na cidade de Jaguariúna, Campinas, pelas oitavas de final da Copa São Paulo de Futebol Júnior.

Entra ano e sai ano, basta começarem os campeonatos regionais para que mais uma vez e novamente, ocorram atos de vandalismos e barbárie entre torcidas rivais, expressos também, nas próprias letras dos cantos entoados pelos respectivos representantes.

Em um estudo publicado por Luiz Henrique de Toledo no ano de 1996, pela editora autores associados junto com a ANPOCS (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Ciências Sociais), intitulado Torcida Organizada de Futebol, ler-se na página 66 que "Nos cantos de protestos e intimidação os palavrões são opostos e exprimem, de maneira jocosa, a passividade sexual e, em decorrência deste estereótipo, a subordinação e fraqueza tanto dos jogadores, dirigentes, árbitros, polícia, quanto dos torcedores adversários".

Ou seja, não sobra ninguém, nem tampouco limites para provocar, bater, maltratar e até matar quem quer que seja. Se você pertence a uma torcida rival ou mesmo está apenas usando a camisa do seu time de coração você é um inimigo em potencial e deve ser interceptado, molestado e eliminado.

Segundo Maurício Murad, sociólogo, professor da Universidade Salgado Filho em uma entrevista no ano de 1995, em um periódico que me foge a memória no momento, a causa dessas violências é mais de fundo estrutural, pois o Brasil é um país violento e chega ser ilusão achar que é uma nação cordial. Por ter sido o último país a abolir a escravidão, tornou o quadro social perverso. Portanto a situação histórica e social facilita a violência que ocorre tanto dentro como fora do estádio. Desde quando o campeonato nacional foi criado na década de 70, essa violência vem sendo recrudescida a cada ano.

Se concordarmos o professor Apolônio Abadio do Carmo que nos ensina que a violência no mundo capitalista, não é uma excrescência, um defeito, uma anomalia devido a falta de controle. Não é um acidente, é fruto natural e concomitante da opção filosófico-política que se fez, teremos que concordar que todas as medidas, tais como: legislação específica para crimes que ocorrem em praças esportivas, proibição do consumo de bebidas alcóolicas no estádio e arredores, proibição do funcionamento das torcidas organizadas, perdas de pontos da equipe cuja torcida provocar confusão, encarceramento de torcedores problemáticos durantes jogos dos seus times entre outras, são de cunho paliativos, já que não mexem, nem de longe, com a estrutura social perversa na qual nos encontramos.

São medidas repressivas, apesar de necessárias.

Outros fatores também são citados por Murad, estes de cunho organizacional: impunidade, falha nos ingressos dos torcedores ao estádio, sistema de transporte coletivo precário entre outros são motivos que também geram insatisfação e revolta dos torcedores, potencializando possíveis atos de violência canalizados para os rivais.

Diante do exposto, entendemos que a violência das torcidas organizadas é um fenômeno complexo, de difícil solução a curto e médio prazo. Potencializadas por mediações diversas, tem base organizacional como, também, na forma metabólica como a sociedade vem se organizando.

Como nos diz o jornalista José Geraldo Couto, na Folha de São Paulo de hoje, "Não há soluções mágicas para a violência entre as torcidas, mas "civilizar" as organizadas pode ajudar". Se pudermos ampliar o civilizar, sem aspas, não apenas as organizadas mas, sobretudo, as relações de produção da nossa existência, talvez o êxito tenha um maior alcance, já que a violência das torcidas organizadas é também uma expressão da violência que campeia os diferentes espaços das nossas instituições políticas, econômicas e sociais.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

AI-5 já morreu?


No final do mês de janeiro último ocorreu um sério problema de censura no nosso país envolvendo uma importante pesquisadora da área da educação, educação física e da psicologia social, a jornalista, pós-doutora e professora associada da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (USP), Kátia Rúbio.

A censura veio por parte do Comitê Olímpico Brasileiro em função da publicação de um livro da professora (imagem do livro acima) em que ela se utilizava de expressões e símbolos que no entendimento do Comitê, eram exclusivas do COI - Comitê Olímpico Internacional.

As expressões e símbolos em questão eram os termos "olímpicos" e "olimpíada", juntamente com os coloridos aros olímpicos, simbolos dos Jogos Olímpicos e que representam os cinco continentes: azul (Europa); amarelo (Ásia); Preto (África); Verde (Oceania); Vermelho (Américas).

A notificação recebida pela autora do livro exigia a retirada de circulação do mesmo, que foi desenvolvido objetivando auxiliar os professores de educação física e das outras disciplinas que lecionam para educandos do ensino fundamental e médio no trabalho sobre educação olímpica, tema extremamente raro nas escolas e com pouco material bibliográfico para consulta.

Essa questão fere não só o trabalho intelectual da professora Kátia Rúbio como, também, a autonomia das universidades brasileiras onde pesquisadores e pesquisadoras se encontram e buscam, com o seu trabalho de ensino, pesquisa e extensão, ampliar a capacidade analítica dos fenômenos sociais que nos cercam.

Foi pensando no conjunto desses elementos e movido pelo espírito de solidariedade de classe que um coletivo de professores/pesquisadores do grupo LEPEL (Linha de Estudos e Pesquisa em Educação Física, Esporte e Lazer), tendo à frente a professora Celi Taffarel (FACED/UFBa), que uma moção de repúdio foi enviada ao COB, reivindicando que o mesmo, conforme o documento, "(...)não interfira e não atente, com suas medidas inconstitucionais contra a AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA porque isto significa atentar contra a Constituição Nacional e, em última instância, atentar contra a soberania da nação brasileira. Não será calando as universidades ou lhes impondo restrições quanto ao uso de termos que obteremos o mérito de sermos um PAÍS OLÍMPICO. EM DEFESA DA UNIVERSIDADE PÚBLICA, CONTRA A MEDIDA DO COMITÊ OLÍMPICO BRASILEIRO DE USO PRIVATIVO DOS TERMOS REFERENTES A JOGOS OLÍMPICOS."

Em tempo que se discute o Plano Nacional de Direitos Humanos e que se exige do governo federal a abertura dos documentos da ditadura militar brasileira, chega a ser emblemática esta postura de censura do COB-COI. Vamos torná-la oportuna, utilizando a mesma para além de discutir olimpismo, discutir democracia e cidadania, termos que não fazem parte do vocabulário dos "senhores dos anéis".

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Carnaval e futebol

"Carnaval, futebol
Não mata, não engorda
E não faz mal
Carnaval, futebol
Se joga para cima e vira sol...
"
(Refrão da música Insolação do coração - Carlinhos Brown e Michael Sullivan)


Já é carnaval, cidade!!! Desde o último dia 10, após o Rei Momo Pepeu Gomes receber as chaves da cidade do Salvador e abrí-la para os foliões de todos os "cantos, encantos e axés", o sagrado e o profano se harmonizam nos corpos que pulam atrás do trio elétrico, pois eis que ainda não morreram.

O carnaval este ano aqui em Salvador tem como tema os 60 anos do trio elétrico e os 25 anos da chamada axé music e esta festa, assim como o samba e o futebol, são expressões da cultura brasileira, produto de exportação. Não faltam depoimentos de turistas brasileiros que têm condições de viajarem ao exterior confirmando que os principais produtos made in Brazil são, principalmente, o carnaval e o futebol.

Em 2004, uma revista brazuka, editada em Londres e disponível em formato eletrônico (http://www.leros.co.uk), realizou uma pesquisa perguntando "Qual é a primeira coisa que lhe vem na cabeça quando você ouve a palavra Brasil?" Advinhem quais as respostas tiveram maior percentagem? Acertou quem disse futebol (com 51%) e carnaval (com 20%). Os outros elementos com seus respectivos percentuais foram: país exótico e tropical com 9% e violência com 7%.



Em seu livro O que faz o brasil, Brasil?, editado pela Rocco em 1986, o antropólogo Roberto DaMatta situa, junto com a comida, a malandragem, as vestimentas, a religião, o "jeitinho brasileiro"; o carnaval e o futebol como elementos importantes de definição da identidade brasileira. Não os únicos.

Como brasileiro, sinto-me muito bem em ser reconhecido em outros lugares do mundo por essas duas expressões de alegria, margia, criatividade, espontaneidade e beleza estética e não pela violência, discriminação, marginalidade, fome, desemprego, mortalidade infantil entre outros.

Não obstante, não podemos fechar os olhos para essas que também são expressões da cultura regida pelo capital. Não podemos nos dá ao luxo de ignorar os dados da realidade que nos oferecem o Ministério da Cultura. "20% da população brasileira não está incorporada a nehuma atividade, bem ou serviço cultural a não ser a TV aberta. Só 8% já entraram alguma vez na vida em um museu. Apenas 13% vão ao cinema com certa frequência - em torno de uma vez por mês - e 92% dos municípios brasileiros não têm um cinema ou um teatro sequer. Só 17% dos brasileiros compram livros."



Assim como o carnaval e o futebol, esses elementos também devem fazer parte do acervo cultural do povo brasileiro. Não matam, não engordam e faz um bem danado para a formação humana.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

A volta dos que foram

Início de temporada no mundo do esporte é sempre muito movimentado. Compra e venda de atletas, compra e venda de espaços publicitários, busca de patrocínios para as equipes, reordenamento ou, para ficar mais modernoso, reengenharia financeira, promoções para torcedores, briga por cotas televisivas entre muitas outras coisas. Todos esses elementos, em síntese, compõem o que se costuma chamar de mercado da bola.

Esse mercado, embora exista em todas as modalidades esportivas em maior ou menor ênfase, dependendo do desempenho histórico das equipes, é mais visível, em função da mídia de uma forma geral e, fundamentalmente, da televisão, no âmbito do futebol.

O jogador tal, que no início do ano de 2009 beijava efusivamente o símbolo do clube em que ele atuaria, beija, agora, em 2010, o símbolo de um outro clube, nada mais, nada menos do que o maior rival do anterior e acrescenta: desde criancinha eu sonhava em jogar por este clube.

Há inclusive àqueles que além de falarem e beijarem para agradar a torcida e os patrocinadores, não se fazem de rogado e até mudam a cor das tranças do cabelo. Se era verde e branco, sem nenhum constrangimento, pode muito bem passar a ser vermelho e preto, ora bolas, afinal de contas de quem é o cabelo? Do patrocinador, evidentemente.

Coisa de atleta que sabe fazer o marketing. Afinal de contas, esporte moderno é isso: apenas negócio. Não estamos de forma alguma, desenvolvendo uma reflexão saudosista, defendendo a volta de um tempo já muito distante em que o atleta, no caso aqui o jogador de futebol, se fazia em um clube e nele mesmo se aposentava. Como exemplo desses tipos temos atualmente no Brasil, coincidentemente, dois goleiros que jogam em times paulistas: Rogério Ceni (São Paulo) e Marcos (Palmeiras).

Eis que agora o mercado da bola apresenta um movimento bastante interessante: a volta dos que foram. Refiro-me ao retorno de jogadores brasileiros de futebol que foram vendidos para times europeus e que agora retornam. Ronaldo, Robinho, Fred, Adriano, Wagner Love, Roberto Carlos...



Saudades do feijão brasileiro? Dos gramados e estádios nacionais? Ávidos pelos gritos da torcida? Sei não. Segundo o que dá a entender a imprensa esportiva, existe nesses gestos um projeto sendo desenvolvido: o projeto copa da África.

Explico. Por não estarem indo muito bem nos seus respectivos times na Europa, alguns inclusive esquentando um outrora impensável banco de reservas, os empresários desses jogadores apostam tudo no retorno ao seu país de origem. Aqui, hipoteticamente, eles jogariam, teriam bons aproveitamentos nos jogos e chances reais em serem chamados para a seleção brasileira.

Na seleção brasileira, teriam, mais uma vez, o passaporte carimbado para jogar de novo na Europa, com contratos renovados e milionários. Seria o retorno dos que voltaram. Seria, também, mais uma temática para um novo texto. Aguardemos.