domingo, 26 de dezembro de 2010

Feliz estresse novo

Hoje, não falarei de esporte. Me juntarei às vozes desejantes que imperam nesta época do ano. Mas irei em outra direção. Quero deixar uma mensagem de louvor ao estresse, pois descobrir que esta é a época mais propícia para o recrudescimento do mesmo.



Quando o próximo domingo chegar, já estaremos no segundo dia do novo ano. Já teremos recebido e enviado inúmeras mensagens de esperança, de felicitações e de desejos sinceros de um ano novo de muito sucesso, de muitas realizações, e de "muito dinheiro no bolso, saúde para dar e vender" para os nossos amigos, familiares e entes queridos.

Na segunda-feira novos problemas se apresentarão e os velhos te despertarão para a realidade nua e crua que nos ensina o poeta Mário Quintana, de que "(...) o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça...". Impressão, compreendeu?

Na verdade, continua a vida. Com o tempo fracionado ou não, dividido em segundos, minutos, horas, dias, meses e anos ou não, sendo medido pela natureza, pelos sinos das igrejas, pelos relógios, cronômetros ou não, a vida segue seu curso de maneira inexorável, em sintonia com suas particularidades imanentes e paradoxais.

Acabei de assistir a uma matéria na televisão de que nesta época do ano o nível de estresse da população aumenta em 75%. Em 1988, num congresso em Munique, um médico canadense Hans Selye assim definiu o estresse: "o estresse é o resultado do homem criar uma civilização, que, ele, o próprio homem não mais consegue suportar". Vejam que loucura. Em plena época em que mais se deseja um feliz ano novo, paz e saúde, desenvolvemos sintomas da chamada "doença do século" ou ainda "doença do terceiro milênio". E, paradoxalmente, em função de um modelo civilizatório que nós criamos.

Impossível não lembrar do Drummond a nos ensinar poeticamente que "Quem teve a idéia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez, com outro número e outra vontade de acreditar que daqui pra diante vai ser diferente".

E é com esta crença no peito, com toda a ternura guevariana e a esperança pandoriana de que tudo seja realmente diferente, que desejo a todos vocês, estresses renovados, cada vez mais felizes e sinceros.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Ministra do Esporte

Dilma Rousseff, presidente eleita com 56% dos votos válidos no segundo turno das eleições do dia 31 de outubro último, desde que passou a se preocupar com a formação do seu ministério, colocou como objetivo se cercar do mínimo de um terço de representantes femininas em diferentes pastas. Tarefa nada fácil, já que historicamente as definições são menos de caráter técnico e mais político, e o arco de alianças foi grande: dez partidos, entre os quais PT, PMDB, PSB, PC do B e PDT, e todos vão querer um espaço no futuro governo.

Atualmente são 37 ministérios. Quando Dilma foi diplomada, no último dia 17, faltavam 14 cargos a serem preenchidos, entre eles o da Cultura, Saúde, Assuntos Institucionais, Portos e Aeroportos, Integração Nacional e Esportes. Só para citar os de equação mais difícil no tabuleiro político, segundo os avaliadores da política nacional.

Em se tratando da pasta do Minstério dos Esporte a equação já foi solucionada, mas não oficialmente. Mais é dada como favas contadas a saída do ministro Orlando Silva, que pode vir a ocupar um suposto Ministério Olímpico e a entrada, para substituí-lo, da deputada eleita por Pernanbuco, Luciana Santos. Mais uma mulher no governo da Dilma.

Pernambucana, engenheira elétrica por formação, foi prefeita de Olinda por duas vezes e em outras ocasiões, secretária de ciência e tecnologia e meio ambiente, além de ter ocupado a assembléia estadual como deputada.

Em entrevista ao portal Vermelho, mantido pelo seu partido, o PC do B (a mesma é vice-presidente nacional do partido), a então deputada federal eleita na última eleição que consagrou Dilma, e "atual" ministra do esporte, disse que o foco dela era a Ciência e Tecnologia.

Podemos perceber pela sua trajetória política e pelo próprio interesse explicitado que o esporte passou longe dos seus objetivos mas, como sabemos, concordemos ou não, invariavelmente a escolha é mais política e menos técnica, compondo os interesses corporativos em função do arco de aliança construído para as eleições majoritárias.

Para nós, que defendemos a democratização do esporte, mais verbas para as políticas públicas que efetivamente se volte para o público, para a cidade, para o desenvolvimento de praças e espaços para a prática esportiva e de lazer para todos e não para alguns, pouco importa o nome. O que vale é o projeto que o partido encarna e até o momento, na minha humilde avaliação, preocupa o projeto do PC do B para o esporte nacional, inclusive em função das mediações de todas as ordens provenientes dos megaeventos esportivos que estaremos sediando nos próximos anos.

Otimista, porém, não ingênuo, desejo sucesso a nova ministra. Que o seu partido paute suas ações objetivando a democratização do esporte, a ampliação dos espaços e equipamentos de lazer nas cidades e que articule esses elementos com um projeto de formação ampliada da cultura corporal do seu povo.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Corrupção Esporte Clube

Em 22 de novembro do corrente ano postamos um texto neste espaço intitulado Por que o espanto? onde ecoávamos informações obtidas em outros veículos jornalísticos sobre o fato do senhor Ricardo Teixeira ser beneficiado com 100% do capital relacionado a toda e qualquer transação envolvendo a Copa do Mundo de futebol que será realizado no Brasil no ano de 2014, já que o mesmo é presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e do Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo de 2014.

Eis que justamente na semana em que a capital do país, Brasília, sedia um encontro internacional contra a corrupção e a primeira corrida Venceremos a Corrupção, eventos promovidos pelas entidades Barômetro da Corrupção Global e ONGs (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Contas Abertas, Instituto de Fiscalização e Controle (IFC) e Comunidade de Inteligência Policial e de Análise Evidencial (Cipae) juntamente com centenas de outras entidades), respectivamente, a revista Carta Capital aborda uma matéria na página 38 e 39 da sua edição de número 625 sobre o senhor Ricardo Teixeira.

A reportagem, assinada pelos jornalistas Bruno Huberman e Ricardo Carvalho informa que "A britânica BBC vincula o presidente da CBF à milionária rede de corrupção". Segundo a reportagem que foi levada ao ar pela rede de televisão londrina (só mesmo por lá pode-se assistir a este tipo de matéria), "revelou uma lista secreta com 175 pagamentos de propina feitos pela empresa suíça de marketing esportivo ISL, num total de mais de 100 milhões de dólares. Segundo a planilha, Teixeira teria recebido cerca de 9,5 milhões de dólares entre 1992 e 1997 por meio da empresa de fachada Sanud, com base no paraíso fiscal de Liechtenstein", pequeno principado localizado entre a Áustria e a Suíça.



Em 2001, quando foi finalizada a CPI do Futebol, um marco na investigação sobre a corrupção no futebol brasileiro, que não deu em nada, evidentemente, esta mesma empresa, Sanud, apareceu colada ao nome do senhor Ricardo Teixeira, que na época, se condenado, poderia pegar um mínimo de nove anos de cadeia, uma piada, já que não se trata de morador do Complexo do Alemão e nem da Vila Cruzeiro.

Um outro nome que aparece na lista dos subornados é o do ex-presidente da FIFA, o senhor João Havelange. "O documento mostra 1 milhão de dólares destinados a um item denominado 'garantiaJH'. Havelange já havia sido centro de outro escândalo, quando, em 1998, 1 milhão de francos suiços da ISL [olha ela aí de novo] caíram por engano na conta da Fifa, quando o destino seria a conta pessoal do cartola(...)".

Só para relembrar, os crimes que envolvem o senhor Ricardo Teixeira e que foram expostos pela CPI do Futebo vai desde apropriação indébita (7 milhões de reais em salário da CBF, além de usar dinheiro da entidade para pagar advogados para suas próprias causas), passando pela evasão de divisas (envio de 500.000 dólares a um paraíso fiscal), sonegação (declaração do imposto de renda não conferem com outros dados bancários), lavagem de dinheiro (5 milhões de reais em fraude contábil) e estelionato. Quase um time de futebol inteiro de ações fraudulentas.

Mas o que diz o senhor Teixeira sobre tudo isso? Nada. Absolutamente, nada! "Por meio de sua assessoria de imprensa, notificou que não comentará o caso" da matéria veiculada pela BBC.

Silêncio absoluto e ensurdecedor. Por menos que isso, caem ministros de estado, membros da casa civil e presidentes de países entram em processo de impeachment. Viva o fair play!!!

domingo, 5 de dezembro de 2010

Geopolítica do esporte

Nos dias 19 e 20 do mês de novembro passado, na cidade de Lisboa, Portugal, foi realizada a Cúpula da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Inspirada para fazer frente na chamada Guerra Fria e também lutar contra a dita ameaça socialista vinda do leste europeu, os países que compõem a otan (Bélgica, Canadá, Estados Unidos da América, França entre outros) procuraram na reunião de cúpula resolver o seu problema de identidade, já que os elementos inspiradores da criação deste organismo internacional já não se fazem mais presentes como antigamente.

Um dos elementos da pauta da reunião, em função das novas configurações geográficas, as crises econômicas e a necessidade de discutir setores energéticos fundamentais no século XXI, foi a redefinição de seu "Conceito Estratégico", acrescentando ao mesmo a necessidade de ampliação e cooperação com outros países e organismos internacionais, incluindo aí, advinhem, a outrora arqui-inimiga Rússia. Sendo assim, o líder do Kremlin, senhor Dmitri Medvedev, foi convidado a participar da reunião de cúpula, sendo o primeiro do seu país a ter essa "honra".

Esse fato me ocorreu logo após tomar conhecimento da escolha pela Fifa dos próximos países sedes para a Copa do Mundo de 2018 e 2022, Rússia e Qatar, respectivamente. Coincidência ou não, o fato é que esses países são altamente estratégicos para as intenções objetivadas pela Otan na sua reunião de cúpula, que além da Rússia, considera a Ásia Central como continente vital para conquistar parceiros de fora do eixo Atlântico Norte.

Em um artigo que encontrei ao pesquisar sobre este assunto para redigir esta postagem, o cientista político Luiz Alberto Moniz Bandeira nos lembra que no ano de 1992 "(...) Dick Cheney, como secretário de Defesa do governo de George H. W. Bush, divulgou um documento, no qual confirmou que a primeira missão política e militar dos Estados Unidos pós-Guerra Fria consistia em impedir o surgimento de algum poder rival na Europa, na Ásia e na extinta União Soviética". (Leia o artigo na íntegra clicando aqui).


O Qatar embora faça parte do Oriente Médio, é estratégico para os objetivos dos países membros da Otan em função das suas reservas energéticas (gás e petróleo) e a Rússia é de longe um país militarmente forte. Ela, junta com a Otan, contém nada mais, nada menos do que 95% das armas nucleares do mundo.

Tudo isso pode parecer simples coincidência ou até devaneio de minha parte, mas são elementos interessantes para pensarmos a relação geopolítica do esporte. Dois outros elementos acrescento. Um, de ordem econômica. Segundo o site Máquina do Esporte, a Copa do Mundo de 2018 "(...) pode representar um impacto de até 24 bilhões de euros no futebol local".

O outro elemento é de ordem cultural. Ainda segundo o Máquina do Esporte, "(...) a escolha reforça política adotada pela Fifa desde a época em que a entidade era presidida pelo brasileiro João Havelange. A entidade esforçou-se, nas últimas décadas, para propagar a imagem de disseminadora do futebol por diferentes culturas".

Tanto um, como o outro elemento não são excludentes. Pelo contrário, se interpenetram nessa lógica contemporânea que tem o esporte como uma das expressões da mundialização do capital, da financeirização da cultura, da indústrialização do entretenimento entre outros. A geopolítica do esporte é a política elevada a sua enésima potência.