domingo, 25 de abril de 2010

Ato Olímpico

Em fevereiro nós chamamos a atenção dos nossos leitores e da comunidade esportiva de uma maneira geral sobre a censura sofrida pela professora Kátia Rúbio no tocante a publicação do seu livro "Esporte, educação e valores olímpicos". Segundo o Comitê Olímpico Internacional (COI) e o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) expressões como OLÍMPICO, OLIMPÍADAS e congêneres bem como os aros olímpicos, utilizados no livro citado, eram propriedades das entidades e só elas poderiam fazer uso dos termos e dos símbolos representativos dos cinco continentes.

Essa ação teve uma certa repercussão no campo esportivo e no interior de algumas universidades brasileiras. A UFBa, por exemplo, através da professora Celi Taffarel, Diretora da Faculdade de Educação, encaminhou uma nota de repúdio ao COB. Esta e outras mobilizações, que segundo a professora Kátia Rúbia, vinheram de toda a parte do mundo, fizeram com que o COB voltasse atrás e retirasse a ação contra a obra da professora.

Mas eis que os Senhores dos Anéis não desistiram da empreitada de tornar o que eles chamam de ato olímpico (uso de expressões e tudo o que envolve a organização dos Jogos Olímpicos e Paraolimpícos de 2016), de propriedade única do Comitê Organizador das Olimpíadas e Paraolimpíadas no Brasil.

Com este objetivo, foi realizada no dia 20 de abril, terça-feira última, uma reunião extraordinária em formato de audiência pública, da Comissão de Educação, cultura e esporte para discutir o Ato Olímpico. O assunto da reunião era o seguinte: “Proposta do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos Rio 2016 para alterar o artigo 6º da Lei 12.035, de 2009 (Ato Olímpico) e o § 2º do artigo 15 da Lei 9.615, de 1998 (Lei Pelé) que regulamentam a proteção aos símbolos relacionados aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos”.

A contenda foi resolvida na terça-feira mesmo com uma acachapante derrota de nove votos a zero pela não modificação do Ato Olímpico e da Lei Pelé em favor do Comitê Organizador dos Jogos no Brasil que tem a frente o senhor Carlos Artur Nuzman. Aliás, diga-se de passagem, nem ele e nem o Ministro dos Esportes, Orlando Silva, compareceram à sessão. Este, eu não sei o motivo, mas o Nuzman, provavelmente, já sabia do resultado e poderia ser questionando sobre o Pan de 2007, já que o mesmo, no momento em que seria argüido na época sobre o evento, saiu dizendo que tinha coisas pessoais para fazer, deixando boquiabertos os senadores da república, os mesmos que na terça desferiram uma importante resposta ao senhor Nuzman.

Mas tudo leva a crer que esta foi apenas uma batalha vencida. A guerra continua em curso, com a possibilidade da revogação do Ato Olímpico ser agora solicitada na Câmara dos Deputados.

Importante frisar que este problema não é prerrogativa nossa, coisa de brasileiro, digamos assim. Segundo Fabiana Schiavon, do sítio Consultor Jurídico "Há críticas também contra o Ato Olímpico britânico que prevê as regras de direito autoral para as Olimpíadas de 2012. A norma chega a prever uma lista de expressões proibidas em campanhas de não-patrocinadores oficiais,como “Londres”, “medalhas”, “patrocinador”, “ouro”, “prata” e “bronze”. Nos jogos de inverno do Canadá, segundo o colunista de esporte do UOL, Erich Beting, o McDonald´s chegou ao ponto de impedir que uma rede de lanchonetes utilizasse a palavra “hamburguer” em seu cardápio".

Sobre a próxima batalha, a da Câmara, o nosso amigo e jornalista esportivo José Cruz, a quem aproveito para agradecer os materiais enviados que possibilitaram essa postagem, considera que Nuzman tem pouca chance de obter sucesso em mais essa empreitada.

Sua opinião sobre este episódio pode ser lida clicando aqui.

domingo, 18 de abril de 2010

De um, tudo!!!

Uma semana recheada de assuntos dígnos de serem pontuados para as nossas reflexões e nossos comentários. Eleição para a direção do Clube dos 13, com indícios de favorecimentos pela CBF e pela Rede Globo contra Fábio Koff que apesar dos pesares, acabou sagrando-se vencedor; a utilização de astros da seleção brasileira na propaganda de uma certa marca de cerveja; a ampliação de custos previstos para a construção dos estádios para a Copa de 2014, que já passam de 700 milhões, sendo a maior majoração o referente a Fonte Nova, com um acréscimo da bagatela de 271 milhões de reais e para não nos alongarmos mais, pois só os assuntos preencheriam a postagem deste domingo, o depoimento do jogador Manoel do Atlético do Paraná na 23ª Delegacia de Polícia de São Paulo alegando ter sofrido discriminação por racismo. Segundo ele, o atleta palmeirense, o zagueiro Danilo, teria chamado ele de "macaco".

Essa situação vem sendo, assim como a violência das torcidas organizadas, recorrente no futebol brasileiro e mundial. Na mesma semana, a imprensa espanhola noticiou que o atleta brasileiro que joga no Barcelona, Daniel Alves, foi também alvo de insultos racistas provenientes dos torcedores do Espanyol. Durante o jogo, segundo a imprensa espanhola, podia se presenciar imitações de macacos e ouvir seus chiados característicos. Um outro jogador, Samuel Eto´o, também sofreu em 2006, jogando pelo Barcelona, insultos parecidos dos torcedores do Getafe.

Muitos outros exemplos poderiam ser citados (relembre alguns clicando aqui), o que é uma lástima e representa ainda a incapacidade da nossa civilização de reconhecer, no outro, independente da sua raça, da sua etnia, para situar um termo mais alargado, os seus limites e as suas possibilidades caracterizadas pelo modo como se desenvolvem as diferentes culturas em um contexto complexo e contraditório da mundialização do capital.

O jogador Danilo diz ter praticado o ato após ser agredido. Isso pode até explicar mas não justifica a agressão racista. Aliás, salvo engano, pelo que me lembro da leitura que fiz do livro o que é racismo, do escritor Joel Rufino dos Santos, é justamente em momentos de tensão, de emoção intensa, onde nossas capacidades racionais estão em suspensão, que emergem nossos sentimentos mais primitivos, àqueles que tentamos, cotidianamente, através de estratégias racionais, encobrir dos outros. Lembro-me agora de um livro intitulado "Por que tenho medo de lhe dizer quem sou?", cujo autor me foge. Este nos ensina que o medo de dizer quem realmente somos para os outros se deve ao fato do outro, ao saber das nossas idiossincrasias, acabe não gostando de quem realmente somos. E então usamos estratégias e máscaras para que nos aceitem socialmente.

Danilo também se diz arrependido. Isso depois de ter negado o fato e constatar que fora filmado falando claramente as frases acusatórias. Corre o risco de pegar, segundo o artigo 140, parágrafo terceiro do Código Penal, de um a três anos de prisão. O caso também será julgado pela Justiça Desportiva, onde o clube infrator também pode sofrer punição e o jogador ficar de cinco a dez partidas sem jogar.

Os torcedores atleticanos do Paraná prometem, na partida de volta, se pintarem todos de preto em atitude de apoio ao zagueiro Manoel. Esperamos todos que o protesto legítimo e criativo fique por aí e que o mesmo não se estenda em mais violência.

Por fim, na semana em que o Esporte em Rede completa um ano de existência, cabe agradecermos a atenção de todos vocês, suas participações e comentários bem como a confiança de trabalharem com alguns textos em suas aulas. Esperamos ter podido, durante esse tempo, refletir sobre o fenômeno esportivo para além das suas fronteiras técnicas e táticas e vamos procurar, na continuidade do nosso trabalho, ampliar cada vez mais esse objetivo.

Sigamos, com o apoio de todos vocês, para mais um ano.

sábado, 10 de abril de 2010

Invertamos as prioridades

O Estado do Rio de Janeiro, mais uma vez se torna vítima de uma catástrofe onde as forças da natureza são colocadas como as principais culpadas. Pura retórica, falácia das mais escabrosas que busca retirar do foco os verdadeiros culpados, a saber, a política que atende os interesses das grandes construturas que têm na especulação imobiliária o seu ganho principal e os políticos que teimam em fazer do Estado, tal como nos ensina Gramsci, um instrumento de gerência dos interesses da burguesia.

No dia 01 de janeiro deste ano, o Rio amanheceu com os jornais estapando mensagens sobre ao menos 19 mortes em função das chuvas. 10 na capital, 07 na baixada fluminense e 02 em Niterói, conforme a Folha de São Paulo. No dia 02, ainda com referência na Folha, foi o soterramento o culpado de 30 mortes em Angra dos Reis.

Mais uma vez, a chuva aparece como protagonista da tragédia que acometeu o Rio de Janeiro e região metropolitana no último dia 06. Geralmente chuva e soterramento agem juntos, como uma verdadeira quadrilha.

Se já não bastassem os presídios estarem abarrotados dos "ninguéns: os filhos de ninguém, os donos de nada" (Eduardo Galeano), agora os mesmos deverão ter como companhia a senhora chuva e o senhor soterramento, culpados inconteste das tragédias sempre anunciadas, isso depois que as mesmas ocorrem.

Além da chuva e do soterramento, uma outra culpada é a teimosia. É incrível como as pessoas teimam em morar em lugares tão perigosos. Quanto mais exemplos trágicos pululam nas redes de televisão sempre comovidas com os fatos espetaculares, mais gosto as pessoas ganham em morar nos morros, em construir puxadinhos, em bater laje. São verdadeiros Indianas Jones, adoram viver perigosamente.

Mais o Rio de Janeiro não é só tragédia. É festa também. E isso é muito bom. O problema reside quando as prioridades cedem lugar a projetos que agregam valor às grandes corporações que vão da mídia até as empreiteiras, passando pelos diferentes setores apadrinhados pela política corporativa e pelos políticos corruptos, que pactuam com a elite carioca ou são, eles mesmos, a própria.

Me refiro ao projeto Olímpico, que tanta alegria trouxe aos brasileiros e, em especial, aos cariocas, no dia 02 de outubro do ano passado. No entanto, o governo do Rio de Janeiro deveria saber que desde 1965 o estado não dispõe de plano habitacional, muito embora tenha gasto somas vultuosas em dinheiro e desenvolvido diversos projetos anos seguidos para colocar o Rio na rota olímpica, obtendo sucesso, o que demonstra a capacidade de consolidação dos projetos quando existe vontade política para que o mesmo dê certo.

Como entendemos que a importância de uma Olimpíada para um país, qualquer que seja ele, transcende os aspectos particulares do esporte, assume portanto caráter político e econômico com vários exemplos na história, conclamamos a inversão das prioridades: por um projeto de nação para todos os brasileiros, indistintamente, por uma "ampliação do acesso adequado ao solo das cidades" (uma das diretrizes do Fórum Urbano Mundial, ocorrido, não por acaso, no Rio de Janeiro, dias 26 e 27 de março), pela democratização das decisões inerentes ao desenvolvimento da cidade entre outros.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Já vi esse filme

Na última quinta-feira, 01 de abril, o jornal Correio da Bahia pubicou uma matéria não só verdadeira mas, sobretudo, recorrente: a violência entre torcidas rivais. Nas linhas e manchetes do jornal, ganhou destaque na primeira página o slogan BAMOR X IMBATIVEIS.

Por duas semanas seguidas, 14 e 21 de março, este blog publicou uma entrevista de uma ex-integrante do quinto distrito da torcida BAMOR. Nelas, um relato contundente de quem viveu por dentro as peripécias da dinâmica organizativa das torcidas que mais parecem, segundo um dos comentários obtidos na primeira entrevista, do leitor Carlos Ribeiro, facções criminosas.

Na oportunidade, um colega de profissão e radialista da Maré FM, Del Machado, assim pontuou: "(...) tudo que essa menina coloca é muito grave, sobretudo porque, nem imprensa e nem o Ministério Público(que aliás, fica na zona do conflito) tomam uma providência com relação ao caso das organizadas. É lamentável."

Pois é isso mesmo e queremos fazer côro com o nosso companheiro Del Machado: é lamentável!!! E pelos indicadores da entrevista e da reportagem do jornalista Felipe Amorim, do jornal citado, a briga já extrapolou os muros dos estádios e as arquibancadas, indo parar no interior das escolas e nas salas de aula.

Nos diz o jornalista que "Um estudante do 1º ano do Colégio Governador Roberto Santos, no Cabula, foi esfaqueado nas costas (...) no desfecho da briga iniciada um dia antes por causa da rivalidade entre torcidas organizadas de futebol".

Na reportagem, aparece um capitão da Polícia Militar, Ubiracy Vieira afirmando, vejam vocês, que este fato vem ocorrendo com frequência. É mole? Com frequência, meus caros leitores e ele ainda pensa em colocar os dirigentes da torcidas organizadas, que devem gozar do mais alto grau de prestígio e confiança entre os jovens das escolas afetadas, para realizarem palestras com esses mesmos jovens. Qual o tema? Violência, ora bolas.

Seria cômico se não fosse trágico.

O que me entristece, em tudo isso, é saber que essa temática, sem sobra de dúvidas, voltará a ser abordada aqui nesse espaço. Talvez com mais dramaticidade, destacando vítimas fatais. Torcemos que não. Mas quem sabe, assim, as autoridades competentes, resolvam estudar o caso com profundidade, reconhecendo, inclusive, que este fenômeno tem causas tanto estruturais importantes, relacionadas à maneira como a sociedade se organiza como, também, organizativas, relacionadas ao evento em si.

Para finalizar, sugiro ao capitão Ubiracy que leve os dirigentes das torcidas organizadas para palestrarem também nos batalhões da polícia militar. Os policiais que trabalham nos estádios em dias de jogos estão precisando aprender que violência também gera violência.