domingo, 5 de julho de 2009

Sentimento de nação ou nacionalismo festivo?


Alguns comentários a respeito da última postagem - Seleção brasileira? - me fez perceber que não fui muito claro na minha exposição. Na verdade, quando sentei para postar o artigo tinha em mente uma perspectiva de desenvolver um raciocínio que buscasse enfatizar o sentimento de nação (ou a falta deste) que carregou (ou carrega) historicamente a seleção de futebol de cada país, ou a seleção do beisebol, do basquetebol, do hóquei enfim, a seleção do esporte mais representativo de cada nação.
Penso que isso se deu em função do citado comentário do Platini a respeito dos jogadores dos times locais que não tinham a mesma nacionalidade de origem do time em que jogavam e que com isso haveria - na ótica do Platini - uma perda da identidade dos clubes e dos países. Automaticamente, alguns comentadores da postagem identificaram uma defesa minha de que jogadores de estados nacionais em comum, jogando em outros estados da mesma federação, seria uma excrescência.
O colega e professor Fábio Nunes, da Universidade do Estado da Bahia (campus de Jacobina), assim comentou: "É simplesmente uma questão espacial no sentido geográfico do termo. Ou então chegará um dia que no campeonato "paulista", mas que possui um time com Junior Bahiano como Zagueiro, Fabio Baiano na lateral direita, Junior (aquele que jogou no palmeiras) na lateral esqueda, Vampeta- meia, e Edison, Bebeto e Alex Alves ( "in-memoriam") no ataque diremos que está acontecendo ali uma partida do Campeonato Bahiano".
Se em alguma linha da postagem anterior, defendir o que está expresso nas linhas acima, não foi essa a intenção. Por via das dúvidas retomo aqui a idéia de que a Seleção Brasileira, por ter no seu planteu uma enorme maioria de jogadores brasileiros que jogam no exterior, não cria mais uma identificação, como outrora, entre torcedor e nação. Esses estão muito mais compelidos a torcer pela seleção brasileira muito mais pela festa protagonizada pelo jogo em si do que pelo sentimento de amor, de paixão pelo seu país.
Não estamos de forma alguma fazendo um juízo de valor sobre a situação. Estamos entendendo esta como um movimento histórico que acompanha o próprio processo de globalização. "(...) o documento crucial de identidade do século XXI não é a certidão de nascimento do Estado nacional, e sim o documento internacional de identidade - o passaporte" (HOBSBAWN, 2007, P. 91)
Um dado importante, e que passou desapercebido por alguns e que reforça o argumento sobre a perda de identidade nacional em relação a seleção brasileira foi a recepção fria que teve a seleção no seu desembarque, principalmente nos aeroportos de São Paulo e Rio de Janeiro, tradicionais redutos de festas da seleção brasileira quando esta chega vitoriosa, evidentemente.
Outro dado relevante diz respeito ao número do IBOPE nas partidas televisionadas da seleção brasileira pela maior rede de televisão nacional. A disputa da final da Copa Kia do Brasil, entre Corinthians e Internacional, gerou para a Globo 39,6 de Ibope. Já a final da Copa das Confederações, entre Brasil e Estados Unidos, rendeu apenas 29 pontos. A final paulista entre Santos e Corinthians, rendeu 35 pontos no Ibope para a Globo.
Para Hobsbawn (2007, pág. 92), o futebol é uma "atividade pública" que combina, dialeticamente, três elementos da sociabilidade contemporânea: a globalização, a identidade nacional e a xenofobia. "Graças à televisão global, esse esporte universalmente popular transformou-se em um complexo industrial capitalista de categoria mundial (...)".
Ainda em relação a visão do historiador inglês, o futebol"(...) tem sido o catalisador de duas formas de identificação grupal: a local (com o clube) e a nacional (com a seleção nacional, composta com os jogadores dos clubes). No passado, elas eram complementares, mas a transformação do futebol em um negócio mundial e sobretudo o surgimento extraordinariamente rápido de um mercado global de jogadores (...) criaram uma crescente incompatibilidade entre os interesses empresariais, políticos e econômicos, nacionais e globalziados, e o sentimento popular". (pág. 93)
Nesse sentido, "(...) a lógica transnacional da empresa de negócios entrou em conflito com o futebol como expressão de identidade nacional (...)" (pág. 94)
Não obstante, a enquete que apresentamos durante a semana aponta um dado curioso. Dos dezessete votos computados, nenhum votou a favor de uma seleção brasileira composta apenas com jogadores estrangeiros, característica do nosso selecionado titular atualmente. Sete votos apontaram para um selecionado formado apenas com jogadores nacionais, dois com um misto de nacional e estrangeiro com um percentual maior para os nacionais e oito votos para uma seleção formada de nacionais e estrangeiros, independente de percentual.
Mas como essas configurações não dependem da nossa vontade e nem tampouco dizem respeito a "uma questão espacial no sentido geográfico do termo" mas sim à lógica metabólica do capital que tudo transforma em mercadoria, a crise financeira até forçou alguns craques como Ronaldo e Adriano a voltarem para o seu país de origem, sendo devidamente repatriados.
Mas os centros financeiros do futebol transnacional continuarão a levar os nossos talentos para fora, desde que os mesmos dêem lucros e dividendos, pois essa coisa de nacionalismo só diz respeito aos "úitlmos românticos".
Depois, bem, depois essas mercadorias chamadas jogadores de futebol acabam voltando para o seu país de origem com saudades da favela e do feijão com arroz da mamãe.
Você que coisa mais nacional do que favela e feijão com arroz? Viva a festa!!!

4 comentários:

Marcelo disse...

Muito interessate essa visão sobre a seleção brasileira. Ainda não tinha pensado sobre essa ótica. Fica um pouco de tristeza ao perceber os símbolos nacionais entrelaçados com os interesses do capital.

Antônio (UFBa) disse...

NÃO CONCORDO! O QUE TEM A VER UM PROFISSIONAL TRABALHAR NO EXTERIOR? PERDEU A IDENTIDADE? VOCÊ NÃO GOSTARIA DE FAZER UM PÓS-DOUTORADO NA FRANÇA OU INGLATERRA OU RÚSSIA. DEIXARÁ DE SER BRASILEIRO?

Adonis Cairo disse...

Penso que a questão das seleções de futebol passa por questões difíceis de analisar. Não creio que seja problema o jogador estar fora do país, exceto pelo aspecto - grave - da falta de entrosamento da equipe. No entanto, me preocupa o fato de colocarem jovens, oriundos de famílias humildes, em sua maioria, como gladiadores a levar para a arena o espetáculo do "panis et circensis". Um outro aspecto que me parece grave no futebol das seleções é o fato de esses mesmos jovens representarem o papel de guerreiros numa luta entre nações. Quando penso no apelo de Marx "operários do mundo todo, uni-vos", fico me perguntando que efeitos sob a camada mais inconsciente do pensamento comum uma "guerra de gramado" pode exercer: a certeza de que somos uma nação? de que nada pode nos vencer? de que no momento da guerra todas as diferenças se dissipam? de que o país é mais importante do que a classe? A esse respeito, já que é prá sonhar, prefiro pensar num dia em que todos os jogadores da seleção brasileira serão estrangeiros, o mesmo acontecendo com todos os jogadores de todas as seleções do mundo. E jogando um futebol em que todos os jogadores chutarão as bolas não para atingir o gol adversário, mas para atingir a cabeça dos cartolas e presidentes convidados para as inaugurações. Então, poderíamos gritar, num grande olé, estádio lotado: Jogadores do mundo todo, uní-vos.

Anônimo disse...

Não querendo ser piega, mas sendo. É muito triste o que está acontecendo com o futebol e mais especificamente com nossa Seleção Brasileira. Será que até mesmo a paixão do brasileiro pelo futebol não conseguiu ficar imune ao poder do mercado futebolístico?

Larissa